Depois de duas semanas, produtor de Guaíra é solto

Adenir Stefenon foi preso no dia 24 de julho, em Guaíra (PR), pela suposta prática de trabalho escravo em sua propriedade

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no Rio Grande do Sul, deferiu na manhã desta quarta, dia 5, o habeas corpus para o produtor rural Adenir Stefenon. De acordo com o advogado Luis Claudio Nunes Lourenço, que acompanha todo o processo, o agricultor familiar pode ser solto a partir do pagamento de uma fiança no valor de R$ 20 mil, mesmo valor cobrado na fiança da mulher, Izabel Maciak Stefenon, e do filho, Everton Stefenon, presos em flagrante e já soltos. O trâmite para o pagamento e liberação do produtor começou a partir das 13h de hoje. Ele foi solto à tarde.

– Foram terriveis [os dias que passou na prisão], porque a gente não é acostumado. A gente é acostumado à roça, se criou trabalhando, e a gente passar por uma situação dessa não é nada agradável – afirmou Stefenon em entrevista à segunda edição do “Mercado e Companhia”. 

Stefenon foi preso no dia 24 de julho pela suposta prática de delitos previstos nos artigos 149 do Código Penal e 125, inciso XII, da Lei 6.815/80, que caracterizam trabalho em situação análoga à escravidão em sua pequena propriedade, cuja colheita de mandioca se estende em 4,84 hectares. A acusação afirma que sete paraguaios estavam sem receber salários, expostos à jornada de trabalho exaustiva e sem usufruir de condições mínimas de dignidade para a própria subsistência. A investigação da Polícia Federal e do Ministério do Trabalho relatou que as instalações de moradia dos trabalhadores eram precárias, sem a instalação de banheiros; que os produtores estavam sem receber pagamento; que a jornada de trabalho era de cerca de 15 horas por dia; e que não havia meios para retornarem ao Paraguai.  Adenir teria buscado os produtores paraguaios da fronteira, com a promessa de pagar R$ 2.200,00.

Na decisão de habeas corpus, o relator Victor Luiz dos Santos Laus informa que os estrangeiros portavam aparelhos celulares e que podiam, então, ter acesso à família e à polícia (como o fizeram). A acusação era de que eles estariam presos. Também há fotografias mostrando um sanitário disponível a eles fora da residência, com pia, vaso sanitário e chuveiro, “o que fulminaria a alegação de que precisavam tomar banho no riacho”.

O relator alega na decisão de hoje que as “circunstâncias dos autos não se mostram robustas nesse momento” para a decretação da prisão sem o esgotamento de outras alternativas cautelares. Ele destaca, ainda, tratar-se de um pequeno produtor, sem antecedentes criminais, que explora atividade agrícola para subsistência familiarMuitas evidências, segundo ele, não são comprovadas. Segundo o documento, o produtor havia acordado que o trabalho seria a partir de 21 de junho deste ano, não 10 de março, como dito pelos paraguaios, inclusive “acostando documentação atinente à entrega das cargas de mandioca à indústria no período entre final de junho e de julho de 2015”.

Sobre a coação de vítimas, o texto diz: “assim, considerando as atuais evidências do feito, em vista da incerteza a respeito das ameaças declinadas e até mesmo de quem as teria proferido, bem assim da duvidosa vulnerabilidade das vítimas frente ao empregador, especialmente diante do fato de que mantinham contato com o mundo exterior, tanto por meio de telefone celular, quanto pelo fato de terem declarado não haver qualquer proibição de saída do local de trabalho, não há como se ter caracterizado o temor futuro de coação das declaradas vítimas“.

As verbas rescisórias devidamente pagas, o transporte dos trabalhadores para o Paraguai, os comprovantes de pagamentos de refeições e estadia em hotel para os sete paraguaios, após a atuação estatal, e um abaixo-assinado da comunidade local com para abonar as prisões pesam a favor do agricultor familiar. Segundo o relator, neste caso é preciso ponderar a gravidade da conduta supostamente praticada; a constatação de irregularidades na contratação de empregados estrangeiros; o acerto financeiro e o retorno dos trabalhadores à sua origem; e a pequena propriedade produtiva com poderio econômico não expressivo.

População de Guaíra e família Stefenon

Segundo os familiares, o trabalho estava estimado para durar oito dias, mas a chuva impediu a colheita durante mais de duas semanas, deixando os trabalhadores, no mínimo, por 23 dias na propriedade. Segundo a família, os homens pediram para dormir no local, para não precisar atravessar a fronteira todos os dias. Dona Izabel e o filho foram soltos depois que a comunidade arrecadou R$ 40 mil para pagar a fiança. Mas no mesmo dia, seu Adenir teve a prisão preventiva decretada.

Desde a prisão, os agricultores se mobilizaram diversas vezes na tentativa de sensibilizar a juíza responsável pelo caso. A juíza da Justiça Federal de Guaíra não quis gravar entrevista sobre o assunto. A defesa do produtor alega conflito de decisão e prisão sem justificativa, já que as denúncias de ameaça aos paraguaios não foram comprovadas:

– Como que não tem requisitos para manter a dona Izabel e o Everton presos e tem requisitos para manter o seu Adenir? Mesmo imóvel, mesmas partes, mesmas supostas vítimas. O seu Adenir, em momento algum impedia que eles saíssem de lá. Tinha telefone, se comunicavam por telefone. Eles andavam armados com facão, eles mesmos disseram no depoimento e falaram que o seu Adenir não tinha arma nenhuma. A ilegalidade da prisão, a gente vê nessa situação, que não havia ameaça em relação aos estrangeiros – afirma o advogado da Luis Claudio Nunes Lourenço.

Para Adenir Stefenon, a “indignação maior” neste caso foi a prisão de sua mulher e filho, que não tinham nada a ver com a contratação dos trabalhadores paraguaios. Ele disse também que jamais imaginou que seria acusado de explorar trabalho escravo e criticou a atuação do Ministério do Trabalho. 

– Sou pequeno proprietário. O pessoal do Ministério do Trabalho veio ai tratando de [como se fosse] fazendeiro. Não tem nada a ver, são todos pequenos proprietários na comunidade aqui [de Guaíra] – afirmou.