Bicudo-do-algodoeiro: saiba tudo sobre o inseto e as melhores formas de controle da praga

Principal praga do algodão nas Américas gera gasto extra de US$ 100 a US$ 150 por hectareNo início da década de 1990, o Estado do Paraná era responsável por mais da metade da produção nacional de algodão. Hoje, o cultivo paranaense não supre nem a demanda do próprio Estado. Um dos motivos para esta situação é uma praga capaz de destruir até 70% da lavoura em uma única safra. O bicudo-do-algodoeiro é o inseto de maior incidência e com o maior potencial de dano nessa cultura.

Ele atingiu também as áreas produtoras do Nordeste na mesma época, aniquilando a produção pela dificuldade de controle químico e fazendo a cultura migrar das suas regiões tradicionais, Paraná e São Paulo, para o Centro-Oeste do país. A principal praga das plantas de algodão das Américas obriga os produtores a um gasto extra de US$ 100 a US$ 150 por hectare, para que seja possível o seu controle.

Junto à Helicoverpa armigera, o bicudo ocupa a primeira posição no ranking de pragas de maior relevância econômica para a cultura do algodão, seguidas por outras como a lagarta falsa-medideira, o pulgão, os ácaros, o percevejo marrom e a mosca-branca. Um problema sério em uma cultura que tem alta competitividade no mercado e que, por isso mesmo, exige custos muito controlados, para garantir rentabilidade ao produtor.

Segundo um estudo do entomologista e pesquisador da Embrapa Algodão, José Ednilson Miranda, realizado nas regiões produtoras de algodão no Brasil, abrangendo nove Estados, o ataque destas pragas provoca uma perda média de 11% da produção.

Aqui, você vai saber tudo sobre esse pequeno besouro de apetite voraz e alta capacidade de gerar filhos e netos durante uma mesma safra. Entendendo como ele nasce e se desenvolve, é mais fácil se preparar para o manejo da praga.

O inseto

O bicudo-do-algodoeiro (Anthonomus grandis) é um besouro da família dos curculionídeos, de coloração cinzenta ou castanha e mandíbulas afiadas, utilizadas para perfurar o botão floral e a maçã dos algodoeiros. A origem do inseto é a América Central e ele chegou ao Brasil em 1983, no Estado de São Paulo. No mesmo ano, também foi encontrado no Nordeste.

O adulto do bicudo tem comprimento médio de sete milímetros, com variação de três a nove milímetros, e uma largura equivalente a um terço do comprimento. Os ovos, larvas e pupas se desenvolvem no interior dos botões florais e maçãs. O ciclo de vida de ovo a adulto é completo em cerca de 20 dias e podem ocorrer de quatro a seis gerações do besouro durante uma safra.

O manejo

O bicudo tem grande capacidade de se reproduzir, podendo existir gerações múltiplas durante uma única safra, o que pode causar prejuízos fatais à produção. O Nordeste já chegou a ter dois milhões de hectares de algodão e, hoje, restam apenas 350 mil. A convivência com o bicudo geralmente determina maiores riscos à cultura, ao ambiente e até mesmo ao homem – neste caso, por intoxicação devido ao uso intensivo de inseticidas.

O manejo pode ser feito de três formas: controle biológico, controle cultural e controle químico. Os pontos mais importantes são a escolha da cultivar; época de plantio; catação de botões florais; destruição da soqueira e rotação de culturas.

Nas amostragens é necessário observar a presença de botões florais com danos provocados pelo bicudo, sendo mais comum encontrar os orifícios de alimentação, e em menor proporção orifícios para reprodução. Também é importante recolher amostras nas bordaduras das plantas em separado do restante da área cultivada, para que seja possível diagnosticar insetos que ainda não passaram das áreas mais isoladas, já que a infestação começa justamente pelas bordas.

O pesquisador do Instituto Agronômico do Paraná (Iapar), Walter Jorge dos Santos, indica a instalação de armadilhas com feromônio “grandlure”, 20 dias antes da semeadura até 60 dias após a emergência das plantas, para registrar a presença de adultos na área cultivada. A captura de um ou mais adultos por armadilha a cada semana determinará a necessidade de aplicação de inseticidas nas faixas ou talhões atacados.

Segundo Santos, o “bicudo deve ser considerado como praga-chave no planejamento e controle dos insetos nocivos ao algodoeiro”. O controle biológico está sendo cada vez mais usado, por ser mais eficiente e seguro que o químico. Entre as medidas de controle, estão:

• Destruição de soqueiras, para reduzir a taxa de reprodução do bicudo durante o período de entressafra. Em prazo inferior a 30 dias após a colheita, deverá ser efetuada a destruição de raízes, caules, botões florais, flores, maçãs, carimãs e capulhos não colhidos, através do arranque e destruição dos restos culturais;
• Preparo antecipado do solo em aproximadamente 40 dias, para provocar um efeito “desalojador” dos adultos remanescentes de entressafra na área cultivada;
• Utilização de cultivares precoces;
• Semeadura na época recomendada para cada região e simultânea entre talhões vizinhos;
• Instalação de plantio-isca nas áreas tradicionalmente infestadas;
• Aplicações de inseticidas nas bordaduras ou área total, a partir da fase inicial da emissão dos botões florais antigos, já atacados pela praga;
• Catação e destruição de botões florais danificados e caídos sobre o solo (preferencialmente nas bordaduras), para a quebra do ciclo de desenvolvimento das larvas do bicudo presentes nos botões atacados e caídos ao solo. A catação deverá ser feita no período crítico da praga (entre 55 e 75 dias), uma a duas vezes por semana. Em áreas de até 15 hectares, a catação será feita na área total. Áreas maiores deverão ter as catações concentradas nas bordaduras;
• Utilização de produtos redutores de crescimento de plantas para aumentar a eficiência dos inseticidas;
• Aplicação simultânea de desfolhantes e inseticidas para reduzir danos e a densidade populacional da praga;
• Estabelecimento de soqueiras-iscas vegetadas para atração e combate aos bicudos emigrantes no final da safra;
• Instalação de Tubos Mata Bicudo (TMB) – um tubo de papelão impregnado com substância atrativa e um inseticida que deve ser posicionado 1 metro acima do nível do solo, principalmente em pré-semeadura e também na fase de colheita e pós-destruição das soqueiras para redução populacional do inseto.

Somente na fase adulta da espécie é que o bicudo fica exposto à ação dos inseticidas. As aplicações deverão estar baseadas em dados de amostragens e a intensidade das infestações e os riscos determinarão a frequência das pulverizações. Para que a redução populacional seja significativa, é preciso aplicar inseticidas sobre os adultos que estão surgindo, isto é, entre 20 e 50 dias, e também sobre os que estão saindo durante o período de pré-colheita.

Para manejo dos inseticidas para o controle do bicudo, o pesquisador recomenda até os 80-90 dias de idade das plantas o uso de produtos como: endosulfan, paratiom metilico, metidation, malathion e fenitrotion. No Brasil, o endosulfan tem sido o produto mais aplicado até os 80 dias. Nos Estados Unidos, o malathion é o principal inseticida para o controle da praga, principalmente no programa bem-sucedido de erradicação do bicudo nas diversas regiões cotonicultoras daquele país.

A partir dos 80-90 dias, é possível aplicar piretroides que são mais efetivos nas formulações “suspensão concentrada” e “ultrabaixo volume”. A alternância entre grupos químicos é aconselhável para um manejo adequado do uso dos inseticidas, evitando, com isso, desequilíbrios ambientais, que fazem surgir o problema da resistência de pragas.

Saiba como o bicudo ataca

As fêmeas depositam os ovos nos botões florais e maçãs do algodão, cobrindo o local com uma espécie de cera. Dois dias depois, as brácteas, que são folhas modificadas com objetivo de proteger as flores, tornam-se amareladas, se abrem e, cerca de cinco dias depois, o botão floral atacado cai.

Neste local e no interior dos botões florais, as larvas terminam seu desenvolvimento, transformando-se em um novo adulto. As larvas são brancas, permanecem encurvadas, e quando desenvolvidas apresentam entre cinco a sete milímetros de comprimento.

É no período de frutificação, quando as densidades populacionais são altas e há escassez de botões florais, que as maçãs são atacadas. Os adultos originários das maçãs são geralmente mais aptos a sobreviver durante a entressafra.

Após a colheita e destruição das soqueiras, os adultos migram para áreas próximas, de vegetação permanente. Nestes locais, os insetos permanecem com o metabolismo fisiológico reduzido, alimentando-se esporadicamente de grãos de pólen de diferentes espécies vegetais – é como se hibernassem, esperando o próximo ciclo do seu alimento preferido. Durante a entressafra, grande parte dos adultos é destruída pela ação de agentes naturais, mas o número de sobreviventes é sempre suficiente para infestar a safra seguinte.

Os adultos do bicudo que sobreviveram à entressafra iniciam o ataque a partir das bordaduras, as plantas que delimitam a lavouras, mais próximas das áreas de refúgio. Na ausência de botões florais, os insetos se alimentam do pecíolo, que é a haste das folhas, e da parte terminal do caule das plantas jovens. Até os primeiros 70 dias de vida das plantas, o inseto pouco se movimenta, permanecendo em reboleiras concentradas nas bordaduras, a partir desta fase é que inicia o processo de dispersão por toda a lavoura e pelas áreas vizinhas.

Por que a cultura cresce no Cerrado

As características ambientais do Cerrado, principalmente no período de entressafra, com baixa umidade relativa, temperatura elevada, escassez de refúgios e de alimentos alternativos, são fatores que desfavorecem a sobrevivência dos adultos do bicudo do algodoeiro.

Além disso, a variedade de algodão produzida no Centro-Oeste tem qualidade superior às antigas lavouras do Sul e Sudeste. O motivo é o comprimento da fibra, maior e capaz de produzir tecidos mais nobres. Mas, mesmo nessa região, o inseto tem atacado e causado prejuízos.