Quem deve pagar o Funrural?

Especialista em tributos do agronegócio Florence Haret responde a dúvidas do público e explica as mudanças legislativas

Fonte: Canal Rural

O Fundo de Apoio ao Trabalhador Rural (Funrural) é uma contribuição que gera muitas dúvidas no setor rural por ser declarado inconstitucional quando vinculado à Lei 8.540. No entanto, em 2001, a Lei 10.156 instituiu um novo Funrural, considerado legal. Desse modo, há maneiras de interpretar notícias que sugerem o pagamento ou não pagamento desta contribuição. A especialista em tributos do agronegócio Florence Haret respondeu, nesta sexta, dia 24, às principais perguntas enviadas pelo público do Canal Rural.

Kellen Severo: O que é o Funrural?

Florence Haret: Cada lei institui um Funrural diferente, então o produtor tem que ter a consciência de que as leis vão alterando os Funrurais. O Funrural em si significa a cota patronal do INSS, então o INSS patronal mais o RAT [Risco de Acidente do Trabalho], ou GILL-RAT, que é o grau de incapacidade relativa laborativa pelos riscos ambientais do trabalho. Essas duas siglas, esses dois tributos juntos, constituem o Funrural, e na mesma guia de recolhimento tem um outro, que é a contribuição de terceiro, que é o Sebrae, que também é sobre a receita bruta, mas é um fundo diferente, uma destinação diferente.

Kellen: A questão principal, que traz à tona essa dúvida do produtor, é que alguns devem pagar, outros não. O produtor pensa: qual é a regra? O que aconteceu que gerou essa dúvida?

Florence: Quando o produtor tem a consciência que a cada lei nós temos um Funrural diferente, ele tem que interpretar esses artigos, essas notícias, dessa forma. O Funrural que foi criado pela Lei 8.540, de fato, foi declarado inconstitucional no recurso extraordinário do [frigorífico] Mataboi. Esse recurso extraordinário teve recuperssão geral reconhecida mais a frente. Esse Funrural foi afastado e é nesse que os produtores precisam exigir esses recolhimentos indevidos na Justiça. O fato é que, depois disso, houve uma outra lei, que é a 10256/01, de 2001, que instituiu um novo Funrural, este que não foi declarado inconstitucional pelo STF. Isso significa que, para a Receita, que tem suas instruções normativas, especialmente a IN 971, ela traz um aspecto vinculante do Fisco no sentido de que esta lei dá legalidade ao Funrural de 2001, então esse Funrural deve ser combrado. 

Kellen: Então aquela premissa que alguns agricultores têm, de que o Funrural estava extinto, não é verdadeira?

Florence: Não é verdadeira. Esse Funrural de 2001 permanece. 

Kellen: Qual é a orientação geral para o agricultor neste momento?

Florence: É difícil nesse cenário todo dar uma orientação única, mas entendo que a melhor orientação a ser dada é: para os agricultores que recolheram o Funrural da Lei 8.540, que eles peçam esse Funrural de volta. Eles podem entrar com uma ação pedindo esse recolhimento. Essa ação corre um prazo prescricional, corre um prazo contra o produtor rural de que se ele não entrar com uma ação logo, ele perde esses valores recolhidos indevidamente. Com relação a esse Funrural que está sendo cobrado pelo Fisco hoje, previsto na lei de 2001, como há esse precedente do Mataboi, eu aconselho aos produtores entrarem com uma ação e obterem uma liminar salvaguardando eles do recolhimento. 

Kellen: João Nunes, de Itaí (SP), quer saber se foi cancelado o Funrural. Se não foi, é necessário descontar em soja e milho e outros? 

Florence: A ideia é de que cada lei institui um Funrural, então se essa lei de 2001 não foi declarada inconstitucional pelo Supremo, ela permanece vinculante para o Fisco, então o Fisco vai, sim, cobrar esses valores, e nesse sentido, o adquirente possui essa obrigação como responsável tributário de fazer essa retenção. Isso significa que o produtor tem que emitir essa nota fiscal pelo sped, o adquirente que tem que emitir a contranota e, nessa contranota, ele já faz essa retenção dos 2.3% do produtor pessoa física. 

Kellen: Roberto, de Santo Anastácio, em São Paulo, diz o seguinte: “Eu produzo amendoim e na comercialização estão cobrando 2,3%. Isso é devido?”. Marcos Ribeiro, de Definópolis (MG), pergunta quais os critérios para ser concedida a liminar para o Funrural para pessoa física e, “ao vender a mercadoria, de quem é a responsabilidade de recolher o Funrural?”.

Florence: Essa lei de 2001 permanece em vigor, então o Funrural de 2001 permanece. Isso significa que aquele produtor que não entrou com uma ação e não tem liminar será cobrado pelo Fisco. Se ele não foi cobrado, foi algo positivo, mas não significa segurança jurídica nenhuma. Agora, o adquirente, por sua vez, é responsável tributário por uma obrigação devida ao produtor rural. Se o produtor rural deve isso, não tem nenhuma liminar a seu favor, o adquirente, se ele não efetuar o recolhimento, se não efetuar essa retenção como responsável tributário, vai responder pelo contribuinte, que é o produtor. O adquirente fica na situação de que: se o produtor tem liminar, ele não pode reter. Se o produtor não tem liminar, ele vai reter, é obrigação dele. Se um dia o Fisco for exigir esse Funrural do produtor e o produtor não pagar, o próprio responsável pagará. 

Kellen: Elisson, de Primavera do Leste (MT), pergunta: “produtor que não tem funcionário pode deixar de pagar o Funrural?”.

Florence: Na verdade, é o caso do segurado especial. O segurado especial, que é o previsto na Constituição, que é o caso que deu ensejo ao Funrural, por ele não ter faturamento, lucro e empregados, ele não poderia recolher sobre a folha como sempre foi feito no regime geral. Então, essa condição de segurado especial, que é o produtor rural sem empregado, num regime familiar de produção, deu ensejo ao Funrural. Hoje, o segurado especial tem essa obrigação também e o diferencial é que o Funrural pago pelo segurado especial constitui, num só tempo, a cota patronal e a cota empregado do próprio segurado especial. Então, é o INSS individual. Essa é a diferença com relação do segurado especial, que não possui empregados, do contribuinte individual, falando na linguagem da Previdência, que é o produtor rural com empregados.