Plano Safra é mesmo a melhor forma para financiar a produção?

Excesso de exigências para liberação de crédito e juros reais altos fazem com que recursos não chegam em sua totalidade às mãos dos produtores rurais

Fonte: Suelen Farias/Canal Rural

O Plano Safra 2017/2018 oferece ao produtor rural R$ 116 bilhões a juros controlados. Mas o histórico de planos dos últimos 18 anos mostra que nem tudo o que governo oferta realmente chega às mãos dos agricultores. Na temporada 2016/2017, por exemplo, apenas 62% foram acessados. Um dos motivos é o excesso de garantias exigidas pelos bancos para liberar recursos. 

O agricultor Joaquim Reis, de Santo Antônio do Descoberto (DF), já custeou lavouras de grãos com os recursos disponibilizados pelo governo. Mas há sete anos não pega valores do Plano Safra. Apesar de os juros controlados serem mais atrativos que os de mercado, as exigências para conseguir um empréstimo ficaram tão rígidas, segundo ele, que é impossível atendê-las.

De 2012 para cá, afirma Reis, os bancos querem hipotecar a propriedade para ter uma garantia real. “Mas a maioria das nossas áreas da gente é arrendada. Antes a própria safra era garantia real. O ‘plano B’ é com a trading, mas aí os juros quase dobram – acho que de 7,5% vai pra 12%”, diz.

Há outros impedimentos para os produtores rurais. As taxas de juros reais do Plano Agrícola e Pecuário – que correspondem à tarifa subsidiada pelo governo menos a inflação do ano – chegaram a ser negativas entre 2012 e o primeiro semestre de 2016. Mas o cenário mudou nos últimos anos, e a expectativa é que, no fim de 2017, a tarifa de custeio fique em 4,38%.

Há nove anos, o avicultor Fernando Ribeiro, também do Distrito Federal, pegou R$ 800 mil do crédito do Plano Safra para erguer quatro galpões em sua granja. Na época, a taxa de juros era de cerca de 7%, com 12 anos para pagar. Agora, ele afirma que não poderia pegar os recursos oficiais com as taxas anunciadas pelo governo, já que anteriormente os juros reais eram negativos.

“Hoje, com a inflação de 4%, eu tenho um juro real de 3,5%, então acaba desbalanceando um pouco o produtor, que tem dificuldade para fazer esses pagamentos”, afirma Ribeiro. 

Fontes

Entre 1999 e 2017, apenas 93% dos recursos foram aplicados. Nos primeiros anos desse período, o acesso superava 100% do que foi disponibilizado. Mas os percentuais ficaram bem mais baixos nos últimos anos. De acordo com o economista da Federação de Agricultura e Pecuária do Rio Grande do Sul (Farsul), Antônio da Luz, a partir de 2015, com a crise econômica, o volume de depósitos à vista atingiram uma queda de 36%. Já os depósitos em poupança, de onde também sai o dinheiro para o crédito rural, caíram 18%. 

“Como tem menos recursos para serem emprestados e não se pode dizer que não tem o suficiente, os bancos elevam extremamente as suas exigências, fazendo com que haja seletividade no crédito”, afirma o economista.

Para o advogado e ex-secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura José Carlos Vaz , outro grande desafio é fazer com que, além dos recursos, as taxas de juros controladas cheguem ao produtor.

Segundo ele, essa questão é política, e não tem um viés técnico como deveria ter. “As taxas não chegam para o produtor como foi anunciado porque existe a prática de mix de recursos e existe taxação de IOF na operação de crédito rural. Se as taxas fossem muito vantajosas como os produtores exigem, levaria a uma elevação dos preços dos insumos”, afirma Vaz.

Esse é um dos fatores que incentivam o produtor a buscar dinheiro no mercado. De acordo com o superintendente técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA), Bruno Lucchi, quando o governo oferece uma taxa de 9,5%, na realidade, a tarifa pode chegar a quase 20%. 

Ele acredita que o produtor deve avaliar o que é mais vantajoso, pois às vezes o crédito não oficial do banco pode oferecer taxas anuais de 16% – sem as exigências do crédito oficial. “A própria indústria que faz o barter, a troca por insumos, às vezes oferece uma agilidade que é muito mais vantajoso para o produtor”, diz Lucchi. 

Segundo o ministro Blairo Maggi, o que vai ser ofertado na próxima safra não chega nem a 50% da real necessidade da produção brasileira. Para a CNA, o Ministério da Agricultura precisa lutar por custos administrativos bancários mais baixos para que mais dinheiro chegue ao produtor. Outra reivindicação é por uma política agrícola de longo prazo, para que o produtor possa se programar.

Bruno Lucchi afirma que a CNA vem buscando consultorias especializadas desenhar as diretrizes básicas dessa estratégia. “Eu não vou conseguir engessar um orçamento por cinco anos, mas eu posso deixar amarrado, por exemplo, algumas linhas de investimento que são prioritárias para o país”.