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Crise no setor de carne da Argentina pode afetar mercado de grãos

Segundo analista de mercado, existe um temor de que medidas restritivas adotas pelo governo também possam ser impostas ao milho e a soja

A indústria de carne bovina na Argentina vive uma crise e amarga prejuízos após o governo local decidir impor limites às exportações. Até o dia 31 de outubro de 2021, os produtores daquele país devem respeitar uma cota de 50% de carne bovina que pode ser vendida ao mercado externo.

A medida de restrição, anunciada em maio pelo presidente argentino Alberto Fernandez, não agradou os produtores locais, que ameaçam uma paralisação do setor produtivo como forma de protesto.

“A restrição para exportação de carne bovina gerou tanto descontentamento, que há rumores de uma greve do setor produtivo no país, e não apenas dos produtores de carne, mas do agro como um todo. Há um temor que medidas restritivas também sejam adotadas para outros setores agrícolas, como é o caso do milho e da soja”, diz Fernando Iglesias, analista da Safras & Mercado.

“Considerando a importância da Argentina como exportadora e de milho e importante player mundial de soja, uma paralisação teria impactos em escala global”, complementa.

Na última terça, 31, as entidades ligadas à Confederação Intercooperativa Agropecuária Limitada (Coninagro), afirmaram que devem avaliar os passos a seguir e não descartam uma paralisação geral das atividades. “O governo nos leva a realizar ações que não gostaríamos. Junto com nosso Conselho, vamos tomar a decisão, considerando os prejuízos a toda a cadeia”.

A revolta da indústria pode ser explicada pelos prejuízos acumulados desde que foram anunciadas as restrições nas vendas externas. Segundo cálculos do Instituto de Estudos Econômicos da Sociedade Rural Argentina (SRA), a cadeia de bovinos e carne na Argentina acumulou perdas de US$ 1,084 bilhão desde maio de 2021.

Adotada com o argumento de baixar os preços da carne bovina no país, o que se viu até o momento foi o oposto disso. “Em junho de 2020, o preço do novilho era de 90 pesos (R$ 4,75) por quilo de animal vivo. Em igual período deste ano, que é o dado mais atualizado que temos, o valor chegou a 182 pesos (R$ 9,62) por quilo de animal vivo. Claramente a tentativa de baixar os preços com a restrição dos embarques foi um tiro no pé”, pontua Iglesias.

Como já era de se esperar, a adoção de cotas para exportações de carne bovina impactou fortemente o mercado argentino. Em maio deste ano, o volume das exportações recuou 10,4% na comparação com o mesmo período de 2020. Em junho, último dado oficial do governo argentino, a retração nas exportações foi de 32,4%. Foram 49,104 mil toneladas comercializadas, contra 72,592 mil em junho do ano passado, segundo dados fornecidos pela Safras.

O Conselho Agroindustrial Argentino (CAA), que reúne 64 grupos no país, enviou nesta semana uma carta ao presidente Alberto Fernandez pedindo o fim das cotas de exportação. No entanto, os inúmeros problemas econômicos da Argentina, como inflação em alta, peso desvalorizado e balança comercial em déficit, dão sinais de que a situação não poderá ser revertida em um curto período.

Exportação limitada na Argentina é bom para o Brasil

Com o comércio restrito por uma medida governamental, a Argentina abriu espaço para que dois outros grandes players aumentassem a oferta de carne bovina no mundo. Segundo Fernando Iglesias, Brasil e Estados Unidos são os mercados mais beneficiados com a menor participação argentina neste momento.

“O resultado das exportações brasileiras de carne em agosto foi ótimo e soubemos aproveitar esse espaço. Mas é importante salientar. Além desta ‘ausência’ da Argentina no mercado de carne bovina, os problemas, como secas e disparada no preços dos bovinos, em outro player importante, a Austrália, beneficiaram tanto o mercado brasileiro quanto o norte-americano nesses últimos meses”, diz.