Opinião

Do consumo de alimentos à agricultura de baixo carbono: precisamos falar sobre ESG

Gestor do Cecafé afirma que governança socioambiental tem ganhado popularidade durante pandemia e aponta pesquisas que mostram preocupação de consumidores com questões sobre sustentabilidade

O buscador mais popular da internet precisa de apenas 0,97 segundos para apresentar quase 84 milhões de resultados sobre ESG. Traduzida como governança socioambiental, a sigla não é recente. Mas é inegável que ganhou popularidade mundo afora durante a pandemia – ao menos, entre empresas de pesquisa que buscam antecipar o comportamento de consumidores de alimentos e de bebidas nos próximos anos.

A edição de 2021 da pesquisa global da Euromonitor, por exemplo, apontou que 69% dos empresários entrevistados entendem que a preocupação dos consumidores com questões sobre sustentabilidade aumentará no pós-pandemia. Percentual ainda maior (72%) dos participantes relatou que iniciativas para a chamada agenda verde serão fundamentais para o sucesso dos negócios.

*Thiago Masson é gestor de Sustentabilidade do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé). Foto: divulgação

Pesquisa do grupo financeiro UBS sobre mercado de alimentos também revelou conclusões similares no último 26 de abril.  Quarenta por cento dos 5 mil entrevistados relataram a intenção de não colocar marcas descomprometidas com critérios ESG no carrinho de compras. O percentual foi similar ao da rejeição por produtos em decorrência de aumento de preços.

Os consumidores ouvidos nos Estados Unidos, Reino Unido, França, Brasil e China também se declararam dispostos a pagar prêmio médio de 9% para produtos com selos verdes. A disposição para desembolsar mais com produtos sustentáveis foi ainda maior entre jovens de 18 a 24 anos.

Outra constatação relevante da UBS para os gestores de marketing: as emissões de gases de efeito estufa já está entre as quatro principais preocupações dos consumidores. Perde apenas para a poluição causada pelos plásticos, o desperdício de alimentos e as gorduras saturadas. Não à toa, gigantes multinacionais do setor de alimentos já fixaram datas para neutralizar a pegada de carbono em suas cadeias de suprimento. São os casos de Nespresso (2022), Starbucks (2030) e Danone (2050).

A julgar por essas duas pesquisas globais, os consumidores deverão elevar a barra de critérios socioambientais no pós-pandemia – dos rótulos dos produtos nas gôndolas dos supermercados às cláusulas de ESG nos novos acordos de livre comércio entre nações.

Na prática, temas como conservação da biodiversidade, trabalho decente, redução da pegada de carbono, boas práticas agronômicas e rastreabilidade deverão moldar a nova arena de competição no mercado global de bens agropecuários nos próximos anos. A responsabilidade com questões sociais e ambientais em todos os segmentos das cadeias agroalimentares será decisiva para reputação e para o acesso de marcas a novos mercados no exterior.

A agropecuária brasileira poderá surfar essa nova onda verde no mercado de alimentos. Um dos principais desafios à frente, entretanto, vai muito além dos limites das porteiras. O mercado global de pagamentos por serviços ambientais precisará deslanchar na mesma velocidade de cruzeiro em que as novas gerações incluem a responsabilidade ambiental como lembrete no topo das listas de compras.

Padronização de métricas é um pressuposto das commodities internacionais. E não deverá ser diferente para a precificação do carbono. A diretora do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva, alertou a comunidade internacional sobre esse tema durante seu discurso na Cúpula do Clima que a Casa Branca realizou no final do mês passado: “Há mais de 60 mecanismos de precificação de carbono. Mas o preço médio é de US$ 2 por tonelada. Esse preço precisa chegar a US$ 75 até 2030 para atingirmos as metas de Paris”, advertiu.

Ela ainda destacou a urgência de os países do G20 (grupo das nações mais ricas do mundo) fixaram um piso para os preços internacionais de carbono. Esse patamar mínimo poderá incentivar investimentos em agricultura sustentável em países em desenvolvimento e dinamizar o mercado de pagamentos por serviços ambientais.

O fato é que a adoção de sistemas de agricultura de baixo carbono e a conservação de matas nativas nas propriedades rurais poderão inserir o Brasil na rota de atração de recursos financeiros associados a metas de ESG. Mas os países precisam avançar em marcos regulatórios que incentivem o mercado internacional de compensação de carbono. Essa poderá ser uma grande contribuição da COP-26 – a próxima conferência das Nações Unidas sobre clima e meio ambiente que acontecerá em Glasgow, Escócia, no final do ano.

A cafeicultura brasileira é exemplo de setor que poderá colher boas safras no mercado de ESG. Propriedades cafeeiras no país avançam em sistemas agroflorestais e manejo integrado de pragas. Estudos científicos já comprovaram a eficiência das práticas sustentáveis tanto para o sequestro de carbono quanto para aumento da produtividade dos cafezais.

Políticas públicas, cooperação internacional e coordenação entre os diversos elos das cadeias agroindustriais serão fundamentais para que o combate às mudanças climáticas também resulte em oportunidades de negócios para a agricultura.

É nesse contexto que o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) aprovou seu planejamento estratégico para o ciclo 2021-2024. Por meio de ações concretas que fomentem a renda e a sustentabilidade socioambiental no campo, o segmento buscará aproximar, ainda mais, a cafeicultura brasileira das oportunidades do mercado ESG – do campo aos armazéns de torrefadores em mais de 120 países que importam o produto nacional.

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