Mercado e Cia

Venda antecipada: produtores e compradores buscam saída em caso de quebra de safra

Algumas entidades que representam agricultores também querem um gatilho para ajuste de preço caso as cotações subam muito

A seca está prejudicando as lavouras de milho em Mato Grosso, e a preocupação de alguns produtores é não conseguir cumprir os contratos de venda antecipada. “Se não chover, com produtividade menor, isso vai aumentar o custo, porque além de você não ter o grão para cumprir o contrato, você vai ter que buscar no vizinho”, conta o agricultor Robson Weber.

O produtor Gabriel Lenz vendeu cerca de 60% da produção a R$ 32 por saca. Agora, se não conseguir produzir, ele terá que pagar a diferença dos contratos ou comprar no mercado, com a saca a R$ 80 para honrar os compromissos.

De acordo com o advogado Alessandro Azzoni, em alguns contratos existem cláusulas que justificam a quebra de acordo em caso de força maior. “Por exemplo, uma estiagem muito grande, uma chuva torrencial, eu acredito, sim, que serviria como um caso fortuito de força maior, mas isso é uma interpretação judicial, então ainda existe essa fragilidade. Existem cláusulas também que são colocadas para o equilíbrio econômico financeiro dos contratos, quando são contratos de longos períodos, de ajustes de mercado”.

O presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), Antônio Galvan, diz que a maioria dos contratos de venda antecipada não tem essa cláusula e quando tem não é respeitada pelo comprador. “Isso não tem como continuar dessa forma. Nós aceitarmos um produtor ficar devendo para uma empresa que sequer deu um centavo para ele ou tenha financiado a safra dele. Resumindo: se você não conseguiu produzir, o contrato tem que ser anulado, porque quem não deixou acontecer foi a natureza”, defende.

Em entrevista ao Rural Notícias, o presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), André Nassar, diz que as empresas são sensíveis aos produtores que perderam a safra por fatores climáticos, mas não vão aceitar eventuais calotes deliberados, por questões de diferença de preço entre o que foi acordo e o valor atual de mercado. “Uma coisa é quebra de safra, outra é calote. Nesse caso, as empresas vão trabalhar para que ele cumpra o contrato. Não pode renegociar ou romper”.

Em Santa Catarina, produtores e compradores encontraram uma saída diante da quebra da última safra, por causa da seca: adiar a entrega. “As indústrias optaram por dar uma chance para o produtor. ‘Se você não colheu, eu não vou te matar. Eu preciso que você continue produzindo, você me paga o ano que vem’. Não vi nenhuma ação jurídica contra um contrato”, diz Enori Barbieri, vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Santa Catarina (Faesc).

Galvan é contra o calote mas cobra reciprocidade quando essa disparidade de preços acontecer no sentido contrário. “Quando o produto cai muito de preço, eles começam a judiar do produtor na classificação. Produto para ele [as empresas] não serve, não presta. Querem fazer desconto”, diz.

O advogado Alessandro Azzoni aconselha o produtor a, antes de assinar um contrato de venda antecipada, procurar ajuda especializada. Se já assinou e tem o produto disponível, a recomendação é entregar. “Por mais que seja injusto fazer a entrega de um produto que possa ter uma alta, cumpra o contrato, porque é uma questão de credibilidade, não só do produtor, mas da trading e uma credibilidade nacional. E você tem que ter esse princípio porque o reverso pode acontecer, você pode ser penalizado no futuro e os contratos são sempre de longo prazo”, diz.

O vice-presidente da Faesc, assim como outros representantes dos produtores, propõe a criação de um gatilho para situações de grandes distorções de preço contratado e de mercado. “Mas tem que ter a noção que o gatilho é para os dois lados. Porque contrato ninguém é obrigado a fazer. Agora, o produtor será que vai honrar esse gatilho ou ele tem perna para honrar esse gatilho quando estoura para o lado dele o tiro?”, questiona.