Economia

Otimismo com PIB de 2021 tende a mudar, afirma economista

Felipe Tamega analisa os efeitos do fim do auxílio emergencial e a deterioração do quadro fiscal no país

PIB, dados
Tamega projeta crescimento de 2,5% no PIB em 2021. Foto: Agência Brasil

O ritmo de retomada da economia nos últimos meses criou um otimismo “exagerado” sobre o cenário de crescimento em 2021, que deve passar por grande revisão. A avaliação é do economista-chefe da Itaú Asset Management, Felipe Tamega, que considera os efeitos do fim do auxílio emergencial e a deterioração do quadro fiscal no país.

Nesse último caso, o economista afirma que parece não haver disposição no governo e Congresso para enfrentar o custo político do ajuste fiscal e o debate se inverteu, com a proposição de reformas para abrir espaço para mais gastos, e não para reduzi-los. “A discussão começa com o gasto e se fala em gatilhos para financiá-lo. Mas, com esse nível de dívida, a discussão tinha de ser como conseguir uma trajetória descendente dos gastos.”

De acordo com Tamega, começa a ficar claro que o grande motor da queda da atividade econômica não foram as restrições impostas pelos países, mas sim o medo. “Com a redução do nível da contaminação e das mortes, as pessoas se sentem mais seguras para saírem às ruas. Então, ocorre o mesmo descasamento do início da pandemia – em que houve queda rápida da demanda, enquanto a produção foi “desligada” mais lentamente -, mas agora de maneira inversa: a demanda volta, mas a produção ainda não voltou. E o que tinha de estoque no início, que inicialmente parecia muito, foi sendo gasto nos vários meses em que tudo ficou parado na economia”, diz.

O economista afirma que é difícil dizer quando a atividade de crescer novamente. “Tem muitas forças que ainda vão bater sobre a economia de ambos os lados, para que continue mais forte e para que desaqueça. O primeiro ponto é o fiscal. Um dos elementos que explicam a retomada mais forte é a expansão fiscal enorme que estamos fazendo por conta da pandemia, com destaque para o coronavoucher. Outubro deve ser o pico dos desembolsos de coronavoucher, porque, dado o espaçamento de pagamentos que a Caixa fez, alguns beneficiários podem receber a parcela de R$ 600 e de R$ 300”, afirma.

Tamega diz que enquanto houver dinheiro injetado pelo governo na economia, a demanda brasileira deve se manter alta. “Em dezembro, deve ter queda razoável de demanda, e, em janeiro, mais ainda. Mesmo que se aprove o Renda Cidadã, entre R$ 200 e R$ 300, ainda assim deve haver desaceleração importante, porque o número de beneficiários deve cair de 64 milhões para algo como 20 milhões”, destaca.

O que pode colaborar é a perspectiva de que a desaceleração fiscal deve acontecer na mesma época que a chegada da vacina. “O Doria (João Doria, governador de São Paulo) está falando que as primeiras doses chegam em dezembro. Se isso ocorrer mesmo, tende a suavizar um pouco a queda do PIB na virada do ano, porque a mobilidade aumenta e setores deprimidos retomam. Mas acho que o otimismo todo que as pessoas têm hoje com a atividade de 2021 tende a mudar, acho que vamos ter revisão grande ao longo do tempo para o PIB de 2021”.

O especialista projeta quede de 4,6% no PIB brasileiro em 2020 e alta de 2,5% em 2021. “Ainda acho que estamos sendo otimistas no 2,5%. Mas é um crescimento trimestral muito baixo, da ordem de 0,3%. Para dar 3,5% e 4%, como o Banco Central tem falado, o crescimento trimestral seria de 0,8% a 0,9%, que é muito alto. Não conseguimos entender de onde vem tanto crescimento, dada essa percepção macroeconômica”, destaca.

Renda Cidadã

Tamega afirma, até o momento, as soluções apresentadas para financiar o novo programa do governo federal foram ruins, mas o lado bom é que essas ideias têm sido rechaçadas. “Se você quiser ser otimista, pode ser que isso implique ter alguma solução de algum corte de gasto para compensar o aumento do Bolsa Família. A leitura pessimista é de que o mundo político, incluindo Executivo e Legislativo, não quer cortar na carne. Acha que é difícil demais, é impopular, como o presidente falou, que não dá para tirar de pobres para dar para os paupérrimos. O fato de que o mundo político não quer enfrentar esse custo deixa uma sinalização negativa para o mercado”, diz.

Segundo o economista-chefe, mesmo as reformas e as privatizações estão sendo vistas como forma de abrir espaço para fazer novos gastos. “A discussão começa com o gasto e se fala em gatilhos para financiá-lo. Mas, com esse nível de dívida, a discussão tinha de ser como conseguir uma trajetória descendente dos gastos. Até porque, o teto de gastos em relação ao PIB demanda isso. Não tem muito por onde escapar, se queremos manter o arcabouço fiscal, que passa pelo teto de gastos, não tem mágica, tem de fazer a consolidação fiscal”, defende.