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Síndrome de Haff: veterinária que pegou 'doença da urina preta' morre em Recife

Priscyla Andrade tinha 31 anos, era apaixonada por cavalos quarto de milha e pela vaquejada; doença é causada por ingestão de peixe contaminado

Priscyla Andrade
Priscyla Andrade praticando a vaquejada. Foto: Arquivo pessoal

A médica veterinária Priscyla Andrade, de 31 anos, morreu nesta terça-feira, 2, vítima de síndrome de Haff em um hospital particular de Recife. A enfermidade, conhecida como ‘doença da urina preta’, é causada pela ingestão de peixe contaminado com uma toxina que compromete o funcionamento dos músculos, rins e outros órgãos.

Segundo estudos acadêmicos, a doença é relativamente rara e foi identificada pela primeira vez em 1924, na antiga União Soviética. Desde então, casos esporádicos são detectados em diversos países. Dessa vez, a vítima foi a médica veterinária e a irmã, Flávia Andrade, 36 anos, que também desenvolveu a doença, mas conseguiu se recuperar.

Priscyla era uma ferrenha defensora da vaquejada e praticava o esporte pelo Haras Maria Bonita, em Sergipe. Pelas redes sociais, a mãe da jovem, Betania Andrade. relatou o ocorrido e, nesta terça, comunicou o falecimento da filha.

Priscyla Andrade
Foto: Arquivo pessoal

“Priscyla, o céu hoje estará te recebendo com muita luz na casa do pai e, aqui, jamais esqueceremos da sua humildade, caráter e eficiência como profissional meiga, linda, alegre, sorridente e cheia de luz”, diz a mensagem.

Peixe contaminado

Segundo Betania, as duas filhas passaram mal após consumirem um peixe chamado arabaiana, conhecido também como olho-de-boi. “Priscyla e Flavia almoçaram por volta de 12h30, mas cerca de 5 horas depois Priscyla me ligou dizendo que não se sentia bem. Em pouco tempo ela relatava dores musculares fortes e, gritando, desligou. Liguei na portaria do prédio e descobri que ela estava caída. Foi então que a levei para o hospital, e os médicos não sabiam o que ela tinha”, relata.

A internação ocorreu no dia 18 de fevereiro e, além de Priscyla, a irmã Flávia, o sobrinho de Priscyla e empregados da casa consumiram o alimento, conforme relatou Flávia em uma rede social há cerca de cinco dias.

“Eu também apresentei os sintomas. Fiquei paralisada, com muita dor, da nuca ao quadril. Fomos socorridas e pensei que era o estresse da situação, ao ver a minha irmã naquela situação. Acontece que recebi a medicação e voltei para casa e a minha irmã foi para a UTI. Somente depois, um médico comentou sobre outro paciente que ele teve com os mesmos sintomas após comer o peixe arabaiana”.

Segundo ela, o filho teve apenas diarréia e as empregadas tiveram dores moderadas, mas se recuperaram. “Após fazer novos exames, foi indicado o internamento e acabei sendo internada. Tinha muita dor, enjôo e diarréia. Já a minha irmã teve muita dor, falta de ar e problemas no fígado e nos rins”, disse.

“O meu apelo é que tenham mais estudos sobre essa doença, pois o meu diagnóstico foi por acaso, só porque um médico citou um caso e associamos. Que investiguem mais essa toxina, pois não tem como saber se esse peixe está contaminado”, completou.

Doença rara e ainda misteriosa

Surtos da  síndrome de Haff já foram registrados e estudados no Brasil. O mais recente ocorreu de dezembro de 2016 até abril de 2017, acometendo 67 em Salvador, na Bahia. Um estudo publicado no periódico Eurosurveillance descreveu os primeiros 15 casos ocorridos neste surto, todos relatando dores musculares e escurecimento da urina.

Na ocasião, uma equipe de pesquisa composta pelos pesquisadores da Fiocruz Bahia Guilherme Ribeiro, Maria Fernanda Grassi e pelo doutorando Antônio Bandeira, em conjunto com o Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde (CIEVS) de Salvador e profissionais vinculados a outras instituições de pesquisa e ensino, utilizaram a seguinte definição de caso para identificação de casos suspeitos da doença de Haff: início súbito de dor muscular em mais de duas regiões do corpo não relacionados à atividade física, associado a níveis elevados de creatinina fosfoquinase (CPK) e consumo de peixe ou produtos derivados de peixe nas 72h que precederam o surgimento dos sintomas. Dentre os 15 casos reportados, 14 haviam ingerido peixe cozido das espécies ‘Olho de Boi’ (Seriola spp) ou ‘Badejo’.

Em 21 casos semelhantes nos EUA, onde as amostras de peixes ou frutos do mar suspeitos foram testadas, também todas resultaram negativas para diferentes toxinas aquáticas mais conhecidas. Ainda assim, a equipe trabalha com a hipótese de que a causa mais provável da doença seja uma toxina presente na cadeia alimentar aquática.