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Retomada econômica, reforma ministerial, terras indígenas e relações internacionais: confira entrevista exclusiva de Bolsonaro

Na estreia do programa Canal Rural Entrevista, o presidente da República fala ainda sobre produção na Amazônia, melhorias na infraestrutura e o papel do Brasil no abastecimento alimentar do planeta

O presidente Jair Bolsonaro foi o convidado na estreia do programa Canal Rural Entrevista, nesta terça, 24. O chefe de Estado brasileiro destacou a importância do agronegócio durante a pandemia, além de falar sobre a retomada da economia, as demarcações de terras indígenas e o meio ambiente.

Confira na íntegra a entrevista feita pelo diretor de Conteúdo do Canal Rural, Giovani Ferreira, e a repórter de política em Brasília, Paola Cuenca.

Canal Rural – Presidente, um dos principais indicadores da economia brasileira, o PIB, dá sinais de reação e aponta para uma retomada pós-pandemia. Qual a sua expectativa, e de seu governo, nesse terço final de mandato em relação ao desempenho econômico?

Jair Bolsonaro – Olha, nós fomos um dos cinco países que menos perdeu na economia, dada as medidas que nós tomamos por ocasião da pandemia. Se deixássemos à vontade o mercado, seria um desastre o Brasil. Nós conseguimos terminar 2020 com mais pessoas empregadas com carteira assinada do que dezembro de 2019, bem como evitamos o caos social. A partir do momento que muitos governadores e prefeitos mandaram fechar tudo, decretaram lockdown, toque de recolher, 38 milhões de informais, aquelas pessoas que em grande parte trabalham de manhã pra comer à noite, estariam na miséria. Criamos o auxílio emergencial, que não só salvou essas pessoas, bem como manteve a economia em funcionamento. Agora, não podemos deixar de dizer que o homem do campo, o agronegócio, também foi essencial nessa equação. Vocês não pararam. Se tivessem parado, seria o caos total, não só para nós, mas para outros países que importam mercadorias de nós. Então, a previsão, dizem aqui as estatísticas, os institutos, que o nosso crescimento esse ano será acima de 4%. Seria, no meu entender, um número excepcional. E obviamente a gente trabalha para que o ano que vem venhamos a manter o mesmo ritmo.

Canal Rural – O Brasil entende que a pandemia dá sinais de arrefecimento e de que está chegando ao fim. Mas existe uma nova ameaça que é a variante Delta do coronavírus, que já foi identificada em vários países. O senhor acredita que isso pode atrapalhar ou atrasar essa retomada econômica?

Bolsonaro – Desde de março do ano passado, talvez eu tenha sido um dos raros chefes de Estado que disse que tínhamos dois problemas, o vírus e o desemprego, devendo ser tratados de forma simultânea e com a mesma responsabilidade. E disse mais: esse vírus, infelizmente veio para ficar. A prova está aí, uma nova variante apareceu. Logicamente, qualquer nova variante atrapalha, ainda mais se essa nova variante driblar as vacinas. A gente espera, torce, pede a Deus que isso não se concretize, e o Brasil, o mundo parta para a normalidade. Agora, não podemos continuar com essa política de lockdown, adotada por muitos governadores, que foi uma decisão do Supremo Tribunal Federal, deu carta branca para eles agirem, para inclusive ignorar todos os incisos do artigo 5º da nossa Constituição. Se pararmos, será um caos. Não temos mais como fazer com que, de maneira semelhante, fizemos no ano passado o auxílio emergencial. Quando a parcela era de R$ 600, por mês nós nos endividávamos na ordem de R$ 50 bilhões. É impossível você continuar com essa política. Não basta que a Casa da Moeda imprima papel ali. Nós precisamos que o campo produza e a cidade também.

Canal Rural – Ainda falando sobre a retomada da economia, a gente vê que alguns dados como o aumento da taxa básica de juros, o aumento da inflação, os números do desemprego ainda tomando conta da atualidade no Brasil. Como é possível contornar esse dados para que a economia continue com a retomada?

Bolsonaro – Primeiramente, inflação foi para o mundo todo. Não foi apenas no Brasil. Alguns culpam a mim a inflação, em especial ao tocante dos alimentos. De onde veio tudo isso? Você deve se lembrar que março, abril do ano passado, a máxima era: “Fique em casa que a economia a gente vê depois”. Está chegando a conta para pagar. Eu não fechei um botequim sequer no Brasil. Tinha poderes para tal. Quem fechou, no meu entender, fechou amedrontado ou quis apenas seguir o politicamente correto. A economia nossa não é apenas a formalidade, é a informalidade também. A gente espera que volte á normalidade. Você pode ver, muita coisa deixou de ser produzida. Deixou de ser produzida, diminuiu-se a oferta e a demanda continuou semelhante. O reflexo imediato disso é a nossa inflação. Quando você vê, por exemplo, a inflação nos alimentos, voltando nessa velha tecla, o mundo passou a consumir mais. Com o auxílio emergencial, não atingiu apenas a cabeça da família. Atingiu todos aqueles, maiores de idade, que recorreram e não tivessem ganhos no ano anterior. Então foram 68 milhões de pessoas atingidas. O consumo maior não foi apenas no alimento, foi no material de construção. O milheiro de tijolo quase que dobrou de preço. A questão do aço a mesma coisa, entre tantos outros produtos que subiram no mercado. Com a volta, com a retomada da economia, que o povo se conscientize de que ele tem que trabalhar. O trabalho pode evitar um mal maior, porque as pessoas sem trabalho, sem renda, sem produção, morreremos de fome. Teremos desabastecimento. Então, somente pensando dessa maneira, sem se apavorar, sem deixar-se influenciar pela grande mídia, que realmente só leva notícias ruins para a população, nós venceremos esse momento.

Canal Rural – É a retomada ao trabalho que vai dar esse caminho para sair da inflação?

Bolsonaro – Sim. O que é um informal? É o que vende um churrasquinho de gato na praça, vendia ali um picolé na arquibancada no estádio de futebol, um biscoito na praia, a manicure, muitas vezes o barbeiro, o ajudante de pedreiro. Essas pessoas perderam quase tudo. E uma coisa: o trabalho ajuda a prevenir as consequências mais nefastas da pandemia. Quem tem o corpo são é a melhor maneira de se imunizar contra tudo que está aí. E devemos partir nessa linha, deixar de ser tomados pelo pavor. Você sabia que, estatisticamente dizendo, os mais afetados pela pandemia, ou seja, que foram a óbito, proporcionalmente falando, foram os obesos e em segundo os que estavam apavorados? Uma pessoa apavorada tem seu sistema imunológico abalado, e ela sofre mais quando acometida de uma doença qualquer, e com o vírus não é diferente.

Canal Rural – Nessa direção da recuperação econômica, uma das variáveis, que o senhor mesmo já comentou, é a reforma tributária. O ano está caminhando para o fim, mas ainda não foi aprovada a reforma tributária. Tem como fazer essa reforma ainda neste ano?

Bolsonaro – Eu passei 28 anos na Câmara. Nunca tivemos reforma tributária. Quando chega a hora da onça beber água, pintam os lobbies da classe empresarial, os que defendem governadores, a bancada municipalista e o governo federal. Então, dificilmente você chega num acordo. O que eu tenho falado com o Paulo Guedes é tentar a reforma possível. Se quiser fazer nos moldes anteriores, que pode ser a melhor do mundo, como não haverá consenso, voltamos à estaca zero. Realmente, a carga tributária do brasileiro é enorme. A gente lamenta ser dessa forma. Vou dar um exemplo simples, eu pude fazer: gás de cozinha. Tá caro botijão de R$ 130 de 12 kg? R$ 130 está caro. Mas custa na verdade R$ 45 lá na engarrafadora. O que que eu fiz? Zerei o imposto do gás de cozinha. Falta agora os governadores seguirem o mesmo caminho, que não é fácil porque eles têm que achar uma fonte alternativa para suprir o que você perde com aquilo que você deixou de arrecadar com o imposto do gás, mas nós iremos atender a população como um todo. Então, isso poderia passar por uma reforma. Mas quando chega na hora de você falar “eu vou zerar ou vou botar um teto de ICMS de tal produto”, você não tem acordo dentro do parlamento. Então, a gente espera que o Paulo Guedes com a sua inteligência, com seu currículo, faça a reforma possível para nós.

Canal Rural – Outro tema sensível, principalmente nas relações internacionais é o meio ambiente. Explora-se muito, e negativamente, ocorrências como queimadas e desmatamento. Como o governo tem enfrentado essa questão?

Bolsonaro – Vem muito também de interesses. Países outros, que tem uma economia parecida com a nossa, buscam nos atingir e tirar o Brasil desse grande mercado que é o do agronegócio. Você pode ver, no momento, não se fala em queimadas no Brasil, não se fala em desmatamento. Por quê? Os números têm mostrado que nós conseguimos, com medidas preventivas, diminuir bastante isso daí. Deixo claro, é uma política internacional que visa a nos tirar de combate ou diminuir nossa influência no mercado internacional do agronegócio.

Canal Rural – Ainda sobre esse assunto, o ano de 2021 é o ano da COP 26. Como o Brasil está se preparando e deseja ser visto pelo mundo na COP 26?

Bolsonaro – Nós nos faremos presentes. O ministro Juca [Joaquim Álvaro Pereira Leite, do Meio Ambiente] tem trabalhado neste assunto, pegou o trabalho do [Ricardo] Salles, e é um ministro bastante discreto. Você não tem visto ele aparecendo por aí. Então, ele está fazendo um trabalho excepcional para que nós cheguemos na COP sem traumas, sem um número majorado de desmatamento ou focos de incêndio, e ele possa dar o seu recado, como dei na ONU, em primeiro momento, em 2019.

Canal Rural – Essas questões ambientais acabam ressoando nos outros países para dar aquela ideia de que, como não se está fazendo a preservação, os produtos do agro brasileiro também não seriam os melhores para serem adquirido por esses mercados. Como o governo trabalha para melhorar essa imagem e  não ter esse conflito na compra do produto agro brasileiro?

Bolsonaro – Eles fazem a propaganda, mas não deixam de comprar. Se o Brasil deixar de alimentar um pouco mais de um bilhão de pessoas no mundo, o mundo vai passar fome. E você vê as estatísticas. O mundo cresce na ordem de 60 milhões de habitantes por ano. É uma pressão enorme sobre o setor produtivo. Agora tem países da Europa, a grande maioria, que se não fizer esse tipo de propaganda contra nós, os políticos locais não têm voto. Então, vai mais por uma questão ideológica da parte deles. Eu te pergunto: como é o Código Florestal em cada país europeu? Lá existe mata ciliar? Existem reservas? Não existe isso aí. Poderiam, realmente, nos mostrar: “Faça como nós fazemos por aqui”. A melhor coisa que tem que fazer é dar o exemplo. Eles não dão o exemplo, apenas criticam. O que falta à nossa grande mídia aqui também seria começar a vender a verdade, mostrando como é lá fora e como é aqui dentro. O Brasil é um dos países que mais preserva no mundo. Vocês sabem disso, é da área de vocês, apenas ou por volta de 8% está voltado para a agricultura, 22% para a pecuária. E você pode ver, nós estamos bastante avançados na Câmara, um projeto de lei permitindo aos nossos indígenas, que ocupam uma área equivalente à região Sudeste, possam produzir na sua terra também. Que estímulo nós teríamos, que incremento de produção nós poderemos ter a curto prazo. O Brasil, realmente, é uma potência nas commodities do agronegócio, e isso apavora o mundo.

Canal Rural – A China é um dos principais compradoras do produto do agro brasileiro e sempre existe a preocupação de manter essas relações em um bom local para que as compras continuem acontecendo. O senhor tem visto uma forma de continuar ou até mesmo aprimorar essa relação com os chineses para manter esse bom comércio?

Bolsonaro – Primeiro, a China não está fazendo nenhum favor conosco. Se eles pudessem comprar mais barato de Marte, Saturno ou Plutão ou da Lua, eles comprariam. Só que não tem no mundo. Agora, nós não podemos abrir mão da nossa soberania. Sempre disse: “Podemos vender para o mundo todo, mas não permitir que comprem o Brasil”. Então essa é a nossa preocupação, logicamente, as inteligências dos outros países sabem como é o nosso comportamento. E você pode ver, tem um projeto que foi aprovado no Senado permitindo que os municípios possam vender até 25% da sua área para outros países. Nós queremos isso?  Na Câmara, tenho trabalhado para que esse projeto não vá para frente. Se porventura for para frente, a gente vai exercer o poder de veto aqui. Mas a última palavra sempre cabe ao Congresso, que pode derrubar o veto. Nós podemos perder a nossa independência e podemos nos transformar num grande fazendão para o mundo, e isso nós não queremos. Agora, essas pressões dizendo que sou um mal na política internacional não prosperam. Há pouco votou-se a indicação de um brasileiro para uma cadeira não permanente do Conselho de Segurança da ONU. De 190 países, 182 votaram no Brasil. É sinal de que a gente está muito bem lá fora. Tenho conversado também com o mundo árabe. Só na semana passada conversei com dois chefes de Estado. Cada vez mais eles querem aprofundar essa relação que eles têm conosco, em especial, voltada para os produtos do campo, porque nenhum país pode depender apenas de um ou dois países para a sua segurança alimentar. E o Brasil é um país que honra compromissos e honra contratos. Então eles têm esse interesse enorme em comprar de nós. Obviamente, quanto mais ele comprar de nós, pode ser que falte para outro importante país. Da mesma forma que eles querem diversificar para ter a garantia da sua segurança alimentar, nos interessa vender para mais gente para que não venhamos a ser um dia dependentes da importação de um só país.

Canal Rural – Presidente, o senhor comentou que outros países questionam a situação ambiental, mas não deixam de comprar do Brasil. Além disso, o senhor comentou a questão de promover a agricultura em terras indígenas. Mas, na outra ponta, tem a discussão do marco temporal da demarcação das terras indígenas, o que deixa o produtor rural com uma insegurança jurídica. A gente tem avançado nisso?

Bolsonaro – Marco temporal. Foi decidido, quando se discutiu aqui a demarcação da Terra Indígena Raposa Terra do Sol. Está tudo pacificado que seria terra indígena aquela área ocupada pelos indígenas até 1988. Lamentavelmente abriu-se uma nova discussão dentro do Supremo. Eles querem que essa data não esteja especificada. Seja 2000, 2020 ou no futuro, a data que for melhor. Se isso acontecer, nós podemos de imediato ter na nossa frente centenas de novas áreas para serem demarcadas. Além do prejuízo para o produtor rural, [já] que muitos têm familiares que há mais de 100 anos ocupavam aquela terra. Essas terras que hoje são produtivas poderiam deixar de ser produtivas. E outras reservas, pela combinação geográfica das mesmas, poderiam inviabilizar outras áreas produtivas. Seria um caos para o Brasil e também uma grande perda para o mundo. A gente espera que o nosso Supremo Tribunal Federal não modifique essa data, esse novo marco temporal, que foi fixado como sendo 1988.

Canal Rural – Outra variável na produção no Brasil é a infraestrutura logística. Várias regiões precisam de investimentos na infraestrutura para reduzir custos e melhorar as questões de logística. No plano de recuperação econômica, discutido pelo governo, a infraestrutura é uma das prioridades?

Bolsonaro – Olha, se você não tiver como escoar o que você está produzindo, realmente, vai apodrecer dentro da sua fazenda o que você produziu. Uma coisa simples, mas tinha que ter visão estratégica. Graças a Deus, o ministro Tarcísio [de Freitas, da Infraestrutura] tem essa visão. O marco da infraestrutura nossa, da questão rodoviária, foi a BR-163. Em época de chuva, que dura em média quatro meses por ano, você não tinha como escoar o que você produzia para o Norte, do que você produzia, por exemplo, no Centro-Oeste. Faltavam apenas 50 km. O Tarcísio fez isso, e diminuiu em uma semana, 10 dias, o tempo para escoar mercadoria daquela área. Nota 10 aí para o Tarcísio. Por outro lado, o Tarcísio, com a sua visão estratégica também, começou a recuperar o modal ferroviário. A grande marca disso é a ferrovia Norte-Sul, que vem lá do Maranhão, passa por Tocantins, Goiás, até o porto de Santos, em São Paulo. Deve ser inaugurada, com toda certeza neste ano. Faltavam 1.500 km. É iniciativa privada, mas nós, do governo, temos um poder enorme de atrapalhar, e nós nem exercemos esse poder, muito pelo contrário. Já falei com o Tarcísio, vou reservar, não pode ser mais de 4 ou 5 dias, fazer uma viagem num trecho da Ferrovia Norte-Sul e ir parando nas cidades, em especial as que produzem produtos do campo em abundância, para nós mostrarmos a recuperação desse setor. E não é só a Ferrovia Norte-Sul. Nós temos a Fiol [Ferrovia de Integração Leste-Oeste], tem a Fico [Ferrovia de Integração Centro-Oeste], que chamam de costelas, que também está integrando o país, a malha paulista, que se interliga e vai até o Rio Grande do Sul. Então, isso é muito bem-vindo porque você consegue botar na prateleira das pessoas, ou nos portos, mercadoria mais barata para que se pague menos aqui e se exporte com mais competência para o exterior.

Canal Rural – Nas últimas semanas o senhor fez algumas mudanças nos ministérios, e no ano que vem é ano eleitoral. A ministra Tereza Cristina, por exemplo, já disse que pretende se ausentar para concorrer a uma candidatura. Então, o que o senhor planeja para alguns cargos, tanto do Ministério da Agricultura como, talvez, para o Ministério da Infraestrutura?

Bolsonaro – Olha, o que acontece, as pessoas se afastam por ocasião das eleições, e da minha parte eu já falei: “Vai deixar um indicado por você”. Então, a ministra Tereza Cristina, com toda certeza, deve estar em campanha lá em Mato Grosso do Sul para uma vaga no Senado, mas ela vai ter uma linha direta com o substituto dela temporário aqui. Até disse mais para ela: “Tereza, por mim você continua enquanto eu for presidente”. Vamos supor que eu dispute a eleição, não estou dizendo que eu vou disputar aqui, e seja reeleito, ela volta pra cá eleita ou não lá por Mato Grosso do Sul. Então, é tendência nossa, em todos os ministérios, fazer isso. O Tarcísio eu não sei se vai disputar alguma coisa, até que eu tenho falado com os ministros nossos para não se envolver muito em política agora, porque você atrasa os seus projetos e atrasa o Brasil dessa forma. Então o nosso ministério é bastante técnico. Eu acho que no máximo um terço será candidato a alguma coisa e terão muita chance de se eleger, até pelo trabalho que prestaram ao longo desses últimos anos conosco.

Canal Rural – O ministro Guedes tem falado que é preciso modernizar o Mercosul. Qual a sua opinião sobre essa integração geopolítica e comercial dos países que integram o bloco?

Bolsonaro – Olha, o Mercosul nasceu com o presidente Sarney, há muito tempo. Por vezes, o Mercosul nos atrapalha. Em outros momentos, não. Essa grande discussão eu deixo a cargo do Paulo Guedes. Eu tenho a minha opinião pessoal, mas não quero polemizar aqui. Você deve estar sentindo o que que eu acho. O Brasil, é um país enorme, é um país que no Mercosul, mais de 90% da balança comercial junto com esses quatro países são nossas. Agora, a Argentina, por exemplo, é dependente da gente. Parte do setor automobilístico depende da exportação para a Argentina também. Se bem que a Argentina está afundando na sua economia. São as opções pela esquerda, opções que não deram certo na Venezuela, e sabemos onde chega um país que adota uma economia voltada para o socialismo. Mas o Mercosul, me permite aqui, que eu não quero criar nenhum  atrito aí no mercado, eu deixo a cargo do Paulo Guedes e confio plenamente no que ele tem conversado comigo pra onde deve caminhar o Mercosul.

Canal Rural – A gente tem acompanhado alguns momentos de tensão entre os poderes políticos, principalmente, com relação ao Supremo Tribunal Federal. Como o senhor enxerga o desenrolar dessa situação?

Bolsonaro – Olha, eu digo que aqui em Brasília não tem gente com superpoderes. Eu  sou chefe do Executivo, sou transitório, nós temos do outro lado da Esplanada a Câmara e o Senado, também são passageiros. E mais à esquerda, o Supremo Tribunal Federal, onde alguns poucos ministros, no meu entender, têm exagerado, têm se exacerbado, e prejudicam o andamento da nação. Pra você ver, o que está em voga no momento, o que está em jogo é a nossa liberdade. Você não pode, um ministro abrir o inquérito, ele investiga, ele julga e ele pune. A nossa Constituição é bem clara quando fala na liberdade de expressão, no direito de ir e vir, entre tantos outros direitos, e gostando ou não nós temos a obrigação de cumprir a nossa Constituição brasileira, que é uma maneira de que nós possamos viver em harmonia. Lamentavelmente um ministro tem agido de forma completamente diferente disso. Então, entrei com uma ADPF, Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, e está no Supremo e eu espero que siga o mesmo rito de outras ADPFs contra o governo federal, que elas têm prioridade e rapidamente são julgadas. Então, teremos como saber a opinião de cada ministro da forma como o senhor Alexandre de Moraes está conduzindo esse processo chamado fake news, que nem é tipificado em lugar nenhum no nosso Código Penal, ele pode realizar buscas e apreensões à vontade e determinar prisões temporárias e preventivas, abusando, extrapolando o que diz o próprio inciso dois do artigo 220 da Constituição, que nós somos livres para emitir nossas opiniões políticas, ideológicas, seja lá o que for. Então, é um ponto de atrito. Por outro lado, você pode ver, o próprio ministro lá do Tribunal Superior Eleitoral, que o corregedor, o senhor [Luis Felipe] Salomão, determinando a desmonetização de sites que têm posições que ele não concorda. São pessoas que simplesmente defendem, por exemplo, o voto impresso. Ele acha que o voto eletrônico, como é, ele é confiável, então manda desmonetizar. Eu te pergunto: se o TSE pode desmonetizar, ter esse poder, os Tribunais Regionais Eleitorais também podem. Daqui a pouco você pega um estado qualquer onde o TRE é mais simpático ao governador, ele começa a fazer operações de desmonetizações, até de bloquear canais, que sejam contrários àquele governo estadual, ou seja, extrapolou, no meu entender, os limites. Não está arrebentando, arrebentou a corda. Essa semana também outras medidas estou tomando no tocante a isso. Espero que o outro lado julgue essas medidas minhas com imparcialidade. Porque se for simplesmente não julgar, como já aconteceu em dois momentos ações minhas no Supremo Tribunal Federal, ou dizer apenas que não vale o que eu escrevi, tudo que nós escrevemos com a Advogado Geral da União está fundamentado na nossa Constituição, eles estão dando um péssimo sinal para todo o povo brasileiro em especial para mim. Não sou o dono da verdade, agora, eu faço aquilo que o povo assim o desejar. Você pode me perguntar, onde vou estar dia 7 de setembro? De manhã estarei na Esplanada e à tarde estarei na Paulista. O que que nós queremos? É um retrato daquele movimento para o mundo dizendo que o povo, que é o nosso líder, realmente quer paz, tranquilidade e liberdade acima de tudo.

Canal Rural – Recentemente o senhor fez uma medida provisória, enviada ao Congresso, propondo alteração do Bolsa Família, ampliando o número de beneficiários e o valor. E, desde 2020, o governo também tem dado o auxílio emergencial. O governo está tomando um viés mais social, levando em consideração todo o contexto econômico e social que o país está vivendo?

Bolsonaro – Uma parte considerável da população não tem como fazer parte do mercado formal. Vai continuar na informalidade. E dentro desses informais tem alguns que têm seríssimas dificuldades. Tivemos a inflação um tanto quanto acima do normal no tocante a alimentos. Olha só a questão do milho: ele impacta a cadeia do frango e dos ovos. E nós assinamos uma medida provisória esta semana permitindo ao pequeno criador fazer a compra direta do milho junto ao produtor. E como essa inflação foi alta e a média do Bolsa Família está em R$ 192, está acertado com o Paulo Guedes, vai passar no mínimo para R$ 300, sem ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal e sem perfurar o teto. É o que nós temos de gasto todo ano. Eu gostaria de dar um pouco além disso, mas temos que ter responsabilidade. Não podemos consertar um lado e desarrumar outro. Tenho certeza que a equipe econômica, capitaneada pelo Paulo Guedes, vai, a partir de novembro, nos conceder no mínimo R$ 300 para o que, na verdade, agora chama-se Auxílio Brasil, que é uma substituição ao Bolsa Família mais compacta.

Canal Rural – Retornando a um tema que já foi falado na questão das demarcações de terras indígenas. A gente tem a situação dos quilombolas pelo Brasil, que tem uma relação muito direta com o setor produtivo, e também a questão do MST. Como é que o governo tem olhado e trabalhado para garantir a segurança jurídica para os produtores rurais?

Bolsonaro – Olha, o que eu fiz não foi para agradar ao homem do campo, foi para fazer justiça para ele. Hoje o homem do campo não dorme mais preocupado com o dia seguinte, que ele poderia ser acordado com uma portaria do Ministério da Justiça considerando a sua fazenda como terra indígena. Isso foi afastado. Tem que ter critério, você tem que ter responsabilidade e tem que ter uma garantia jurídica para você demarcar uma terra indígena. No passado, era feito quase que “a bangu” [de qualquer jeito]. Os laudos antropológicos, uma parte, fraudados. Outra parte, a questão do homem do campo, ele tem que ter a segurança. Nós aqui, via decreto e portarias, portarias que vêm basicamente aí do Exército brasileiro, nós facilitamos, sem extrapolar os limites da lei, do estatuto do desarmamento, fazer com que ele possa ter arma no campo. O homem do campo hoje, caso ele seja CAC [Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador], ele pode também comprar um fuzil de repetição, pode ter um 762 de repetição na sua propriedade. E nós conseguimos também, além disso, dar o porte estendido pra ele, ou seja, o homem do campo comprava a sua arma e ele passava a ter a posse da arma de fogo e não o porte, e a posse podia ser usada apenas dentro ali da sua casa, da sua moradia. Nós, junto com o parlamento, conseguimos o porte estendido para todos eles. Hoje, o homem do campo pode montar teu cavalo ali, entrar numa viatura, armado, percorrer toda a periferia da sua propriedade. Deu mais segurança para ele e passou a intimidar os invasores, MST. Era comum você ter toda semana notícias de invasões do MST pelo Brasil. Até uma fazenda do FHC [Fernando Henrique Cardoso] foi invadida lá atrás quando ele era presidente da República. Como é que nós conseguimos controlar em grande parte isso? Cortando o dinheiro para esses caras, que vinha do próprio governo federal, em parte, vinha de ONGs. Proibir repasse de ONGs e ponto final. Se é não governamental, não vai pegar dinheiro no tocante do que é do próprio governo. Então, essas medidas, da racionalidade na questão de terra indígena, racionalidade para demarcar quilombolas, não demarcamos nenhum, você estimular o índio a produzir. Isso acaba com o conflito do indígena com o produtor rural. Essas medidas todas diminuem a temperatura, diminuem a pressão e nós partimos para a normalidade, de modo que convive-se hoje, cada vez mais, com essas populações que vão se integrando a nós. Olha, só quando estive na região de São Gabriel da Cachoeira [no Amazonas], há pouco tempo, conversei com tucanos e yanomamis e perguntei em momentos diferentes: o que vocês querem? Primeira pergunta. “Internet”. Já tem internet lá nas aldeias que pediram para nós. E é dessa forma que você consegue pacificar o Brasil e fazer com que todos produzam e ganhe, realmente, com o suor do seu rosto, os meios para satisfazer as suas necessidades básicas.

Canal Rural – Aproveitando que o senhor falou de internet, nós devemos ter novidades com relação ao edital do 5G nos próximos dias. Como o senhor enxerga também essa entrada da internet 5G, ou até 4G em algumas localidades, na vida do homem do campo?

Bolsonaro – Eu estive em Sorocaba [São Paulo], onde uma colheitadeira fez uma demonstração para nós, tinha uma mulher dirigindo a colheitadeira, e ela passava, a margem de erro era de 5 centímetros de uma baliza, ou seja, isso é realmente um sucesso para o campo. Estamos partindo para realmente leilões do 5G, está sendo conduzido pelo ministro Fábio Faria [das Comunicações], e acreditamos que até meados do ano que vem grande parte das capitais nossas já tenham 5G e ela comece a ser utilizada também no campo de forma mais ampla.

Canal Rural – Já que estamos falando de localidades um pouco mais afastadas, como o senhor observa os plantios feitos no bioma Amazônia? Porque existe uma preocupação da sociedade e nós sabemos que existem produtores rurais com propriedades na área do bioma. Como o senhor enxerga isso? É de fato um problema ou é algo que poderia ser encarado como uma possibilidade?

Bolsonaro – Oh, cada região do Brasil você tem que reservar um percentual da área para a reserva ambiental. Na Amazônica tem que reservar 80%. Isso tem que ser respeitado, porque é uma lei aqui votada pelo Congresso Nacional. Você pode ver, se fala em Amazônia, até o ano passado você não podia plantar cana-de-açúcar no estado do Amazonas, que é o maior estado que nós temos no Brasil, por causa de um decreto presidencial. Acertando com a Tereza Cristina, nós revogamos esse decreto. Então, o estado do Amazonas tem que produzir também. Lá, diferentemente do que falam que a Amazônia está pegando fogo, ela não pega fogo. A Floresta Amazônica é úmida. Não pega fogo, nem se você jogar um galão de gasolina e tocar fogo naquela área. Agora, a produção tem que haver. Sem você ter o plantio de cana-de-açúcar, fica muito difícil você falar em etanol. Então, da nossa parte, não temos esse problema de estimular a Amazônia, dentro da lei, também usar até 20% da sua área para plantios e para criação de animais.

Canal Rural – Presidente, sobre as eleições de 2022, o senhor pode falar sobre as articulações para a sua candidatura à reeleição?

Bolsonaro – Eu estou ainda no zero. Não consegui um partido e um partido é igual a um casamento. Não basta querer casar com ela, ela tem que querer casar comigo também. Mas espero que nas próximas semanas eu consiga um partido e comecemos a nos organizar para as eleições do ano que vem. Se bem que isso não é prioritário pra mim, porque eu posso ter o partido até março do ano que vem caso venha disputar a reeleição. Eu acho que vamos partir para a normalidade. Uma preocupação nossa continua sendo quem vai contar os votos. Não desistimos dessa luta e cada vez mais nos preparamos para que tenhamos umas eleições limpas, democráticas, com contagem pública dos votos.

Canal Rural – O senhor pode adiantar quais são os partidos que estão no seu radar?

Bolsonaro – Não, porque quando vazou no passado, foram para lá outros setores interessados e inviabilizaram esse casamento nosso.

Canal Rural – Qual ou quais mudanças o senhor ainda quer realizar no Brasil durante o seu governo em qualquer área?

Bolsonaro – Eu acho que o mais importante já foi feito, não pode deixar de falar, foi o combate à corrupção. Pela primeira vez na vida, um candidato diz que vai combater e combateu de fato. Estamos há dois anos e meio sem uma denúncia de corrupção no nosso governo. A não ser as denúncias fake news da CPI da Pandemia aí. Quando você vai para a prática: Correios, o ano passado, deu lucro de R$ 1,5 bilhão, quando não dava lucro. Esse ano, a previsão é dar R$ 3 bilhões de lucro. Você pega a Itaipu Binacional, que quase nada investia na região. O nosso governo, só o ano passado R$ 2,5 bilhões de Itaipu Binacional. Já está 60% pronta a segunda ponte com o Paraguai, que vai ajudar o nosso agronegócio. A outra ponte, que vai de Porto Murtinho, o ano que vem sai do papel. Na mesma região ali, Foz do Iguaçu, o seu aeroporto aumentamos em 600 metros. Já estamos na iminência de começar a receber pousos de aeronaves vindas de outros países. Também 40 municípios da região foram atendidos no tocante a isso. A Petrobras não tem mais escândalo. Os Correios, como eu disse, também. O BNDES agora atende à população, não atende mais recursos para fora do Brasil. Obras inacabadas do governo do PT? Tiveram, sim, em Angola, na Venezuela, na Bolívia, em Cuba, entre outros países. Aqui no Brasil eles não davam bola para isso. Então, o grande legado nosso, que nós pretendemos fazer, foi isso. Por que? Desde o início, montamos equipes de compliance em cada ministério para poder analisar todos os contratos de modo que nada fosse feito que pudesse dar problema na frente. Se um dia tivermos problema, o governo vai ser o primeiro a colaborar nas investigações. Acho que esse é o grande legado. Por outro lado, nós gostaríamos sim, se não tivesse tido a pandemia, a inflação estaria mais do que controlada pelo mercado, teríamos o gás mais barato, o combustível mais barato, entre outras coisas em melhores condições para população. A economia está reagindo. A gente espera, logicamente, voltar à normalidade nos próximos meses e, a partir do ano que vem, o Brasil continuar o seu ritmo que terminou 2019.

Canal Rural – Presidente, qual a mensagem o senhor tem para passar ao povo e aos produtores rurais brasileiro sobre o futuro do país no pós-pandemia?

Bolsonaro – O Brasil tem um potencial que ninguém tem. Ninguém tem uma riqueza mineral como a nossa, a biodiversidade, água potável, belezas naturais, bem como uma área enorme aqui para a produção. Nós somos o quinto país em extensão territorial. Não adianta você falar em China e Rússia, porque grande parte do território você não pode fazer nada lá, tendo em vista estar numa região menos propícia à agricultura, tendo em vista inclusive a questão da temperatura. O Brasil tem tudo para ser uma grande nação. Sempre tive isso daí. A pandemia nos atrasou bastante, sim, mas confio no Brasil. Confio no seu potencial. Acredite em Deus acima de tudo que nós vamos vencer esse obstáculo. Acredito no Brasil em Deus e no povo brasileiro.