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EXCLUSIVO: China quer risco zero de contaminação nas exportações brasileiras de carnes

Em documento do Itamaraty ao qual o Canal Rural teve acesso, a embaixada do Brasil em Pequim diz que o país asiático pede testagem em massa nos frigoríficos

A China quer risco zero de contaminação por Covid-19 nas exportações brasileiras de carnes e pede testagem em massa nos frigoríficos, informou a embaixada do Brasil em Pequim ao Itamaraty, em documento obtido pelo Canal Rural. Desde o fim de junho, o país asiático tem suspendido frigoríficos brasileiros e de outros países que tenham apresentado casos da doença entre funcionários.

O pedido teria sido feito durante videoconferência no sábado, 18, pelo diretor-geral do Bureau de Segurança dos Alimentos Importados e Exportados da Administração-Geral de Aduanas da China (GACC, na sigla em inglês). Na mesma ocasião, foi comunicada a retirada da suspensão de embarques de um frigorífico brasileiro.

De acordo com a embaixada, a autoridade chinesa reconhece que o risco de contaminação em alimentos congelados ou embalagens é muito baixo, conforme diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Porém, solicitou que o lado brasileiro “adote medidas que convençam a GACC de que não haverá risco de contaminação dos alimentos brasileiros”. Segundo o diretor geral, os chineses não aceitarão a continuidade de exportações de plantas que mantenham em atividade funcionários com suspeita de contaminação.

O secretário de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura, José Guilherme Leal, disse que não irá se manifestar sobre medidas de protocolo solicitadas pela autoridade chinesa, pois elas ainda precisam ser negociadas. A pasta era contra adoção de testagem em massa no momento da edição da portaria 19, que regulamenta as medidas de prevenção em frigoríficos, e por enquanto ainda não há novidades de atualização da posição em relação a essa questão.

Em nota enviada ao Canal Rural, a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) afirma que “não comentará sobre documentos oficiais não endereçados a ela. Ao mesmo tempo, a entidade reafirma a sua confiança na liderança do Ministério da Agricultura, na demonstração da qualidade e da sanidade dos produtos exportados.”

O comentarista do Canal Rural Miguel Daoud acredita que as medidas pedidas pela China são totalmente desproporcionais considerando a relação comercial dos país. Ele lembra que os Estados Unidos também têm um problema grande com a pandemia, mas não têm sido tão afetados por suspensões de plantas.

Por fim, Daoud acha que o governo deveria se posicionar de medida diplomática para mostrar a capacidade do setor de carnes em relação à sanidade da produção.

Veja a íntegra do documento:

Segue abaixo, para conhecimento, informação recebida da Embaixada do Brasil em Pequim:

Em videoconferência, em 18/07, o diretor-geral do Bureau de Segurança dos Alimentos Importados e Exportados da Administração-Geral de Aduanas da China (“General Administration of Customs of the PRC” – GACC) comunicou a retirada da suspensão às exportações de um estabelecimento brasileiro e indicou que espera que o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) adote medidas com vistas a garantir “risco zero” de contaminação das exportações brasileiras de produtos cárneos por COVID-19.

2. Após analisar os relatórios fornecidos pelo lado brasileiro, a GACC decidiu retirar a suspensão ao frigorífico registrado sob o SIF 3941 a partir de 17/07. Outros cinco estabelecimentos permanecem suspensos: SIFs 922, 2015, 1661, 3975 e 60, dos quais apenas o 922 também é caso de autossuspensão. Indagado por que apenas o SIF 3941 foi autorizado a retomar as exportações, o DG explicou que, no entendimento dos chineses, as medidas adotadas por aquela planta asseguraram não haver novos casos de contaminação entre funcionários.

3. Posteriormente à reunião, foi anunciada a retirada da suspensão de um estabelecimento argentino (que havia declarado autossuspensão) e um alemão (suspenso pela GACC).

4. Sobre os critérios seguidos para a suspensão de estabelecimentos, a autoridade chinesa reconheceu que as diretrizes da FAO e da OMS consideram que o risco de transmissão em alimentos congelados ou embalagens é muito baixo, mas afirmou que há estudos que apontam para conclusões distintas. Enfatizou que, neste momento, precisa assegurar “risco zero” de transmissão. Por isso, solicitou que o lado brasileiro “adote medidas que convençam a GACC de que não haverá risco de contaminação dos alimentos brasileiros”. De acordo com o DG, os chineses não aceitarão a continuidade de exportações de plantas que mantenham em atividade funcionários com suspeita de contaminação. Com vistas a preservar a confiança mútua, sugeriu que o MAPA aplique as suspensões nos frigoríficos em que haja suspeita de contaminação de funcionários, o que, na sua opinião, tornaria o processo de retomada das exportações mais simples.

5. As autoridades brasileiras solicitam ser informadas sobre os critérios para a aplicação e a retirada da suspensão. O secretário de Defesa Agropecuária do MAPA encaminhou carta com proposta de medidas a serem adotadas, mas ainda não obteve resposta. O lado brasileiro indagou se os mesmos critérios aplicados ao Brasil estão sendo exigidos de outros países, a exemplo dos Estados Unidos, que tiveram até o momento apenas uma planta suspensa, apesar de registrar número maior de casos e de estabelecimentos habilitados.

6. Após alegar que os exportadores norte-americanos estão recebendo o mesmo tratamento que os brasileiros, o DG reiterou que a GACC espera que as autoridades brasileiras apliquem as medidas necessárias para garantir o “risco zero”. Para a GACC, estabelecimentos com um ou dois casos identificados não precisam necessariamente ser suspensos, mas devem adotar medidas para garantir que nenhuma pessoa com contaminação comprovada ou suspeita continue trabalhando. Como exemplo, mencionou frigorífico não especificado que, após identificar um caso de contaminação, passou a testar diariamente 20% de seus funcionários, além de realizar exames de ácido nucleico em seus produtos. Nesse caso, a GACC entendeu não ser necessário suspender a planta.

7. As autoridades sanitárias chinesas estão sob grande pressão para assegurar “risco zero” de novas contaminações por meio de alimentos importados. É nesse contexto que se insere a expectativa da GACC de que o lado brasileiro adote medidas extraordinárias de combate à COVID-19.

8. O MAPA já apresentou, em versão traduzida para o chinês, dois documentos com descrição das iniciativas que vêm sendo adotadas pelo lado brasileiro:

(a) Portaria Conjunta n. 19 (18/06/2020), que estabelece as medidas a serem observadas visando à prevenção, controle e mitigação dos riscos de transmissão da COVID-19 na indústria de abate e processamento de carnes e derivados destinados ao consumo humano e laticínios; e

(b) carta do secretário de Defesa Agropecuária do MAPA com descrição das medidas adotadas em frigoríficos exportadores para a China.

9. A GACC mencionou como positivas as seguintes medidas que poderiam ser incluídas em protocolo a ser adotado para estabelecimentos que identificarem casos de COVID-19 entre funcionários:

– submeter à quarentena o funcionário com suspeita de contaminação e todos aqueles que com ele tiverem mantido contato direto;

– realização de testes em todos os funcionários do estabelecimento, possivelmente de forma periódica, para assegurar a não ocorrência de novas contaminações;

– suspensão temporária das atividades para desinfecção do estabelecimento;

– realização de teste de ácido nucleico para detecção do vírus em amostras dos produtos a serem exportados para a China.

Atenciosamente,

Divisão de Promoção do Agronegócio-II (DPA-II)

Departamento de Promoção do Agronegócio (DPAGRO)

Ministério das Relações Exteriores (MRE)