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Destruição de mudas de café por causa de nematoides divide Rondônia

Autoridades afirmam que a medida é necessária para proteger a cafeicultura local; produtores falam em prejuízos e falta de opções

Quase 200 mil mudas de café não vão chegar ao campo, em Rondônia. Depois de passar pela fiscalização de rotina imposta pela Agência de Defesa Sanitária Agrosilvopastoril (Idaron), o agricultor Nelson Plantikow recebeu o diagnóstico inesperado do laboratório: mais de 60% das amostras analisadas apresentaram contaminação por nematóides do gênero meloidogyne. Por conta disso, a determinação é que sejam destruídas todas as plantas do viveiro. O prejuízo é estimado em mais de R$ 150 mil.

Plantikow lamenta o trabalho de meses ser perdido e pede mudança na legislação para tentar salvar mudas como essas. “É muito doído enterrar uma muda que pode ter tratamento. Peço uma solução, que se possa rever o nosso lado, porque dessa forma não tem como continuarmos”, diz.

Já a engenheira agrônoma Raquel Schmidt questiona o fato de as análises serem feitas apenas pela Idaron. “A gente sabe que essas análises são passíveis de erros. São pessoas que fazem elas. É possível que tenha um erro de laboratório, um erro de coleta ou alguma coisa que possa influenciar nesse resultado”, defende.

Por que as mudas de café são destruídas?

O decreto que determina a eliminação das plantas vem da instrução normativa 35 de 2020 do Ministério da Agricultura e da portaria 558 de 2016, regulamentada pela Idaron. Segundo o texto, a medida é necessária para garantir a sanidade da cultura no Brasil.

“O produtor não pode estar comprando material propagativo contaminado, tem que estar comprando uma coisa inspecionada e segura de que não esteja contaminada. A gente entende que esse é o principal problema, porque a forma de contaminação do nematoide é via terra contaminada, uma vez instalado no solo aquele solo fica inviabilizado para a cultura do café”, diz Jessé de Oliveira Júnior, gerente de Inspeção e Defesa Sanitária da Idaron.

Cabo de guerra

A falta de um tratamento específico contra a praga desestimula a prática de cultivo de mudas de café em Rondônia. O agricultor Valdecir Piske da Silva era proprietário de um viveiro com capacidade para 700 mil mudas. Em 2019, perdeu 130 mil. Neste ano, as perdas superaram 35 mil.

“Parei, parei de fazer mudas porque não tinha mais como trabalhar diante de uma legislação tão rígida. Se não houver uma mudança eu acredito que muitos viveiristas vão fazer o que eu fiz, vão parar”, afirma Silva.

De acordo com o gerente da Idaron, o avanço da contaminação de nematoides dos viveiros do estado é reflexo de uma flexibilização pelos próprios produtores.

“O canteiro suspenso e o uso de tubetes com substratos inertes estava como obrigatório na portaria e o setor solicitou que nós retirássemos isso, porque iria ficar muito caro fazer esse trabalho. Se o viveirista coletar terra para o substrato em locais de lavouras antigas onde o nematoide esteja presente, é importante que se faça uma amostragem do substrato desse local. Essa obrigatoriedade de analisar o solo também foi retirada da portaria por pressão do setor”, pontua.

Os produtores de mudas de café contestam a afirmação e dizem que para seguir as recomendações preciso gastar mais, sem ter garantia de que o problema será resolvido.

“Houve já casos, aqui em Rondônia, de viveiros suspensos, de mudas sendo feitas nos tubetes com nematoides. Cai por terra a teoria de que não dá meloidogynes nos canteiros suspensos. Outra questão é custo: os tubetes têm um custo maior, as instalações são um pouco maiores por causa de ter que ficar suspenso e isso acaba onerando. Hoje, o preço é de R$ 1,30 por muda, ao passo em que a gente vende a muda na sacolinha a R$ 0,80”, diz Silva.

Números preocupam

De acordo com o Idaron, nos últimos cinco anos, o número de viveiros certificados para produzir mudas de café em Rondônia saltou de 42 para 103, avanço de 145%. Juntos, esses viveiros produziram mais de 14 milhões de mudas no ano passado. Mas 3% das mudas apresentaram contaminação por nematoides e tiveram que ser destruídas, números que preocupam os pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que afirmam ter à disposição dos viveiristas variedades resistentes e tolerantes contra a praga.

“Além disso, temos pesquisas com solarização que é o tratamento do solo usando plásticos e o calor do sol para eliminar os nematoides dos substratos tratados”, afirma o pesquisador José Vieira.