Agronegócio

Projeto de autocontrole sanitário no agro será um marco histórico, diz relator da proposta

Projeto do autocontrole deve ser apresentado na Comissão de Agricultura nesta semana, segundo deputado; Veja pontos que estarão no relatório final

O Projeto de autocontrole sanitário em indústrias do agro que tramita na Câmara dos Deputados deve ganhar mudanças nos próximos dias. O relator da proposta na Comissão de Agricultura da Câmara, deputado Domingos Sávio (PSDB-MG), se encontrou nesta terça-feira, 10, com membros da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) para tratar do relatório final da proposta.

O relator revelou ao Canal Rural detalhes do que pretende colocar no texto que será apreciado pelos deputados que compõem a comissão. Além disso, ele contou quais serão os próximos passos do projeto dentro da Câmara. Confira a entrevista.

Canal Rural – O que foi apresentado na reunião de hoje com a FPA?

Deputado Domingos Sávio – Nós trouxemos uma prévia do relatório que pretendemos apresentar na Comissão da Agricultura, demonstrando que ouvimos cada colega parlamentar, ouvimos os diversos setores da agropecuária, buscando fazer um relatório que seja de consenso, mas preservando, os cuidados com a defesa sanitária para garantir qualidade e saúde, e, ao mesmo tempo, modernizando, desburocratizando, o trabalho da inspeção federal com o alcance também nos estados e municípios.    

Canal Rural –  Quais são os principais pontos do relatório que o senhor irá apresentar?

Deputado Domingos Sávio – Eu diria que vamos ter um marco histórico. Nós vamos ter uma mudança profunda no conceito do processo de inspeção federal e com consequência em estados e municípios, preservando o papel da defesa sanitária, mas desburocratizando a relação com o setor produtivo. Hoje a relação é quase que de tutela, de intervenção, com o estado centralizando tudo. Até para aprovar um rótulo, a empresa tem que mandar o rótulo para o ministério. Uma burocracia enorme, demora meses para aprovar um rótulo. Nós entendemos que é preciso agilidade, para ser competitivo, diminuir custos. Então, a legislação muda esse conceito, estabelece que a empresa faça o autocontrole. Ela verifica o que a lei exige e cumpre o que a lei exige e, a inspeção faz a parte dela, que é fiscalização.

O projeto também muda o conceito de fiscalização, outro aspecto importante. Em vez de ser aquela simples relação punitiva, e até um pouco autoritária, que não analisa as questões pelo risco que ela realmente pode ou não apresentar, a gente muda isso para uma inspeção que é mais preventiva, com uma análise de risco, evitando que o risco de fato prevaleça e tenha problemas no produto. Além da análise de risco, também estamos colocando  de maneira clara um conceito de prevenção e de diálogo, como por exemplo: uma pequena inconformidade de natureza leve, que não afeta e não coloca em risco o produto, e que pode ser corrigida antes de fazer a autuação, a lei estará dizendo. O fiscal pode fazer isso, ao invés de simplesmente chegar autuando por uma pequena coisa que não representa risco, que hoje acaba sendo motivo de multas e mais multas. Isso gera uma relação muito ruim entre quem está produzindo e o papel da inspeção. Nós queremos uma relação de respeito e que seja construtiva. Então, essas mudanças de conceitos estão de alguma forma associadas à lei da liberdade econômica, que trata quem produz com respeito. Não trata quem produz com suspensão de cara. Pelo contrário, tem que ter a presunção da boa fé. Essa legislação respeita o trabalho do fiscal, do auditor fiscal, mas dá também mais autonomia para a empresa exercer o que nós chamamos de autocontrole. Com isso ela ganha em agilidade, diminui a burocracia, consequentemente, diminui o seu custo, torna-se mais competitiva. Ganha, no meu entendimento, o consumidor e a economia brasileira.   

Canal Rural – O setor privado estava preocupado com as multas na proposta inicial. O questionamento é feito sobre os valores, que  seriam muito altos e desproporcionais. Como ficará a questão das multas no texto?

Deputado Domingos Sávio – O relatório aprimora essa relação do fisco com o produtor. Hoje, quando alguém é autuado e aquilo gera uma multa, o produtor só tem uma possibilidade de recorrer, quase que ao próprio fiscal. Ele entra com um recurso na regional, e o fiscal que o autuou é ouvido. Se o fiscal disser: ‘Não, eu vou manter a minha multa’, a empresa não tem mais a quem recorrer. E nem tem efeito suspensivo essa ação em curso. Nós estamos estabelecendo que quem é autuado terá a possibilidade de recorrer primeiro a este fiscal, mesmo através da regional, chamado recurso de primeira instância, com efeito suspensivo. Se não tiver êxito, ele poderá recorrer em segunda instância à defesa sanitária federal aqui em Brasília, com efeito suspensivo. Se mesmo assim não obter sucesso, ele poderá recorrer a uma comissão, que será formada por membros do Ministério da Agricultura, do setor produtivo e até um membro do Ministério da Justiça. Essa comissão irá fazer a análise desse recurso à luz da lei e do que é justo. Se de fato, ele estiver errado, ele vai pagar a multa, ou vai ter uma punição mais dura, que pode chegar a fechar o estabelecimento. Hoje, às vezes o fiscal vai lá, fecha o estabelecimento, e ele vai recorrer com o estabelecimento fechado. Aí já gerou desemprego, sofrimento e, às vezes, foi uma medida exagerada. Então, esses mecanismos na lei são importantes, sem diminuir em nada a responsabilidade de respeitar as normas sanitárias. Só que há a possibilidade de você se defender.

Em relação às multas, o valor das gerou muito problema no projeto que o governo mandou. O governo alega que há mais de uma década, esses valores estavam defasados e mudou o que seria hoje o máximo da multa de R$ 15 mil, a multa máxima, mudando na proposta para R$ 300 mil. Ora, isso quebra um pequeno laticínio, isso inviabiliza uma empresa, acaba com o emprego de todo mundo e não pode ser assim a legislação. Então, nós fizemos uma análise profunda, nós procuramos dividir em quatro níveis essas multas: infração leve, infração moderada, infração grave e infração gravíssima. Nas infrações de leve a grave, são as regras de hoje, as multas continuarão variando para chegar no máximo a R$ 50 mil, e somente infrações gravíssimas, para grandes empresas que processam milhares de toneladas de alimentos, poderão chegar a R$ 150 mil. Isso foi construído conversando com o próprio ministério e conversando com o setor produtivo. Como eu disse, multa nem sempre é sanção mais pesada, porque continua havendo a possibilidade de caçar o registro daquele produto, daquele estabelecimento, ou de fechar aquele estabelecimento. Isso também terá os níveis de recurso para evitar injustiça. Nós achamos um ponto de equilíbrio. Haverá multa? Haverá, mas não será algo exagerado a ponto de inviabilizar uma empresa. 

Canal Rural – Na projeto enviado ao Congresso, os produtores primários estariam isentos de fazer um programa de autocontrole. No entanto, entidades do setor e o próprio governo reconheceram que é preciso ter uma delimitação melhor no texto para deixar claro as diferenças entre produtor primário e produtor industrial. O senhor deixou mais claro esses conceitos no seu relatório? 

Deputado Domingos Sávio – O projeto estabelece uma série de procedimentos de autocontrole para as pessoas jurídicas, para o setor de processamento de alimentos de origem animal, de origem vegetal, dos insumos, das rações, dos medicamentos e dos defensivos agrícolas. O produtor rural é parte importante nisso, mas a autoregulação não alcança o produtor rural diretamente, porque seria complicado para um produtor rural ter que se inscrever no Ministério da Agricultura para dizer como é que ele produz um leite, como é que ele produz uma plantação de soja ou de café. Isso não é razoável. O produto que vem do produtor rural já tem normas claras de qualidade que serão sempre observadas, mas o produtor chamado de primário, não está incluído nesse processo. Porém, em alguns casos, a indústria que processa o alimento poderá se valer de um protocolo privado, entre ela e o produtor, onde ela, antes de comprar, estabeleça com o produtor esse protocolo, de que ele só vai fornecer produtos em que o seu fornecedor assuma a responsabilidade de não estarem contaminados com nada que seja proibido. Esse protocolo privado passa a fazer parte do programa de autocontrole daquela empresa, inclusive para resguardar aquela empresa e ela não ser punida por algo que não foi ela não fez. Isso traz também a responsabilidade do produtor que vier a assinar esse protocolo de responsabilidade técnica pela produção.

Canal Rural – E com relação aos auditores fiscais. Eles estão mantidos nesse processo de fiscalização após esse projeto?

Deputado Domingo Sávio – Os auditores fiscais são preservados na sua autonomia, nas suas prerrogativas, e, eu diria, até valorizados, pois eles terão um papel de fazer sim todo o processo de fiscalização e continuarem assegurando que a regulamentação está sendo respeitada. Eles deixam de ter aquele papel meio intervencionista dentro da empresa. Os próprios auditores hoje, em boa parte contratados temporariamente, estão sendo beneficiados com uma emenda que nós acrescentamos, prorrogando esse contrato. São mais de 200 médicos veterinários com contratos venceriam agora, em novembro. Como a pandemia não permitiu concurso, a gente correria o risco de ter desfalcada a estrutura do ministério, o que poderia gerar problemas para o Brasil, porque esses profissionais são essenciais para garantir a liberação dos produtos para exportação, para dar credibilidade no produto brasileiro que vai para fora, e a equipe dos profissionais de carreira do ministério não seria suficiente. Então, isso está sendo resolvido. Além disso, nós estamos criando o programa VigiFronteira, que é a vigilância sanitária nas fronteiras do Brasil, para melhorar a segurança do trânsito na fronteira brasileira de animais, de vegetais, de produtos de origem animal e de origem vegetal, para evitar doenças, evitar problemas, que podem ser, e devem ser, evitadas com uma boa segurança nas fronteiras. 

Canal Rural – E o Sistema de Inspeção Municipal (S.I.M.) e o Sistema de Inspeção Estadual (S.I.E.)?

Deputado Domingos Sávio – Quanto aos serviços de inspeção estadual e municipal, eu incluí um artigo na lei dizendo que eles também devem observar esse comando federal de autocontrole, ou seja, deve aperfeiçoar a legislação municipal, estadual, para aderirem ao autocontrole.

Canal Rural – Quais serão os próximos passos da tramitação? 

Deputado Domingos Sávio – Eu apresento (à Comissão de Agricultura) esta semana e espero que seja aprovado por consenso já na próxima sessão. espero que o projeto seja aprovado, ainda nos meses de agosto e setembro, na Comissão de Finanças e Tributação e na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Aprovado nessas comissões, ele vai para o Senado e tem chances reais de sair ainda este ano, gerando um benefício para o Brasil.

*Sob supervisão de Letícia Luvison