Café

Santa Catarina tem potencial para produzir cafés especiais, aponta estudo

Segundo pesquisa da Epagri, cultivado em sistemas agroflorestais, o café catarinense tem apelo ambiental e econômico

Há gerações, cafezais crescem no leste de Santa Catarina sob a sombra da Mata Atlântica ou de outros cultivos agrícolas. Um saber-fazer de famílias agricultoras que optaram pela convivência harmoniosa da natureza com o cultivo do grão, que vai dar origem a um café especial, com alto apelo econômico e ambiental. Um estudo comprovou que o café arábica variedade mundo novo, produzido sob a sombra de bananais orgânicos em Araquari, se enquadra como café especial excelente.

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Foto: Epagri

A pesquisa foi realizada por profissionais da Epagri em parceria com o Instituto Federal Catarinense (IFC) campus Araquari e com o Instituto Federal do Sul de Minas campus de Machado, e concluiu ainda que Santa Catarina possui áreas com condições climáticas potencialmente aptas para o cultivo de café arábica especial, considerando a colheita seletiva e adequado processamento pós-colheita para explorar a máxima qualidade sensorial e evitar defeitos físicos nos grãos.

Por fim, a pesquisa apontou a necessidade de mais estudos, tanto sobre a adaptabilidade ao grão ao litoral catarinense, como do manejo de cultivo e pós-colheita. Wilian Ricce e Fábio Zambonim, pesquisadores da Epagri/Ciram, delimitaram o mapa com a região potencialmente apta, de acordo com o clima, para o cultivo de café arábica.

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Com base nestes resultados iniciais, a Epagri submeteu projeto de pesquisa à Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc) para ampliar o estudo sobre cafés especiais no estado. Os resultados do edital de submissão ainda não foram divulgados pela fundação.

“Queremos mostrar o potencial que tem o café especial arábica para a região litorânea de Santa Catarina. Cultivado em sistemas agroflorestais, ele pode ser usado como estratégias de restauração e uso econômico de áreas de preservação permanente nas propriedades rurais familiares”, descreve Fábio, pesquisador da Epagri. Ele lembra que a expansão da cultura no estado teria apelo ambiental e também econômico. “Tem muito agricultor familiar indo bem economicamente com essa cultura”, relata.

Cultivo de cafés especiais

Aspectos de mercado de cafés especiais e do sistema produtivo agroflorestal que o caracteriza em Santa Catarina despertaram o interesse da pesquisa agropecuária, da extensão rural, de gestores públicos, de produtores rurais e da iniciativa privada.

Em Major Gercino, município da Grande Florianópolis, o extensionista da Epagri Remy Narciso Simão começou um trabalho em parceria com o agricultor Amauri Batisti na implantação de 1,8 hectare de cafés arábica das variedades icatu, tupi e também de plantas formadas com sementes de cafezeiros tradicionais da região.

O extensionista aposta que a cultura do café, que faz parte da tradição dos agricultores do Vale do Rio Tijucas, pode ser uma importante fonte de renda associada à manutenção da cobertura florestal existente no município.

No litoral norte do Estado, no município de São Francisco do Sul, o extensionista da Epagri Claudio Souza observa que, na comunidade da Vila da Gloria, os cafezais são cultivados sob cobertura de árvores nativas. Segundo ele, apesar da produtividade não ser considerada alta, os valores obtidos com a comercialização do café torrado e moído pelos agricultores diretamente aos consumidores tornam a atividade importante fonte de renda complementar às propriedades.

No município do José Boiteux, no Alto Vale, o jovem agricultor Matheus Eliaser Lunelli recebeu orientação da extensionista da Epagri Deborah Ingrid de Souza para aderir à produção de café no sistema agroflorestal. Mas quem deu a ideia foi o avô do Matheus.

“O pai dele tinha café plantado e produzia muito bem na nossa propriedade”, conta o agricultor, que recentemente implantou 150 pés numa área de 600 metros quadrados. Ele se diz muito satisfeito com os resultados obtidos até o momento: “dá para ver que todas as plantas estão se adaptando muito bem ao sistema e estão todas bem sadias”.

Deborah conta que a escolha do café para montar o sistema agroflorestal na propriedade de Matheus resgata a cultura e o potencial do Alto Vale para esse cultivo, dada suas características geográficas e de clima. Segundo ela, o grão produzido em sistema agroflorestal se aproxima das condições originais do café, que é uma planta de sub-bosque, ou seja, se desenvolve na companhia e à sombra de outras espécies, o que proporciona ao fruto final uma composição mais interessante, com mais açúcares e outros elementos diferenciados.

A extensionista acredita que, apesar de o cultivo na propriedade de Matheus ter apenas quatro meses, vai dar certo, com a primeira colheita a ser realizada em dois anos. “O grande desafio vem depois, o beneficiamento do grão”, afirma.

A intenção de Deborah é de que essa cultura agrícola volte a compor o mosaico das propriedades rurais familiares do Alto Vale, não só como resgate de uma tradição, mas também como uma nova alternativa de renda para os agricultores locais. Ela também destaca o aspecto ambiental, já que o sistema é agroecológico, ou seja, não usa agrotóxicos e adubos químicos.

Em Itapema, iniciativas interessantes do cultivo agroflorestal de café têm garantido a renda de produtores rurais familiares. Os agricultores Selmo Manoel Santos e seu genro Renato Alberto de Souza, integrantes do Grupo Ecológico Costa Esmeralda, cultivam cerca de 600 plantas de café em sistema agroflorestal consorciado com banana. A produção possui certificação orgânica pela Rede Ecovida.

Inseridas em reserva de Mata Atlântica e sob influência da brisa marítima, as plantas desenvolvem-se em condições específicas de microclima, que influenciam e conferem uma identidade própria na qualidade dos grãos e da bebida. Todo o café produzido é beneficiado pelos próprios produtores, que assim agregam valor à produção comercializada na feira de orgânicos do município.

A família vivencia o seu cultivo há muito tempo, sendo uma das pioneiras na região. Renato relata com tristeza a derrubada dos cafezais que ocorreu na região na década de 1960. Entretanto, há cerca de 15 anos a família retomou progressivamente o cultivo comercial do café e agora renova o seu pioneirismo como referência na cafeicultura regional.